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CONEXÃO AMERICANA
General diz que teve contato com informante da agência
Um agente da CIA
do "Notícias Populares"
Presidente do Clube Militar do
Rio de Janeiro, o general Hélio
Ibiapina, 81, revelou ter mantido
contato com um informante brasileiro da CIA no país e que um
cônsul ligado à agência de informações o interpelou sobre a soltura de um preso. "Eu disse a ele:
"O que o sr. tem a ver com isso?'±", contou à Folha.
Hélio Ibiapina é natural de Fortaleza (CE). Entrou no Colégio Militar aos 12 anos e na Escola Militar
aos 19. Virou general em 31 de
março de 1975. Foi para a reserva
em maio de 1979. Formou-se em
fevereiro de 1966, em inteligência
militar, na Escola das Américas,
no Panamá. "Nunca nos deram
aulas de terrorismo", disse.
Amigo pessoal do ex-presidente
Humberto de Alencar Castelo
Branco, recebeu a Folha em seu
apartamento, no Rio de Janeiro
(RJ). Conversou com a Folha após
colocar seu próprio gravador ao
lado de uma mesa em que se via
quase uma centena de medalhas
militares.
Folha - O que sr. sabe da presença norte-americana no Brasil?
Hélio Ibiapina - Precisamos primeiro situar isso no tempo. Acompanhei o assunto de 1963 a 1966.
Não posso falar do DOI/Codi e da
Oban, porque não estava ligado de
maneira nenhuma a esse problema. Mas, em 1963, por exemplo,
quando o Ibad apareceu em Pernambuco e na Paraíba, tinha alguma ligação com os norte-americanos e com a CIA, sem dúvida nenhuma. Eu fui até encarregado pelo Castelo Branco, que era o comandante do Quarto Exército, de
verificar isso. Procurei o Ibad para
saber como ele agia e cheguei à
conclusão de que realmente era ligado à CIA.
Folha - Como reagiu Castelo
Branco?
Ibiapina - Ele tinha medo dessas coisas, achava que polarizar os
EUA com os comunistas poderia
transformar o Brasil num Vietnã.
O Castelo mandou fechar o Ibad
(Instituto Brasileiro de Ação Democrática).
Folha - Como o sr. descobriu isso?
Ibiapina - Pela minha experiência e cursos em informação. Eu encontrei, por exemplo, um agente
da CIA que era metalúrgico de São
Paulo, contratado para verificar a
ação sindical no Brasil. Apesar de
ser da CIA, e como era brasileiro,
ele não quis dar as informações à
CIA sem dar conhecimento a alguém da segurança no Brasil. Ele
relatava sistematicamente para os
Estados Unidos o que estava acontecendo por aqui, mas me transferia os relatórios. Eu sabia tudo que
ele relatava e, em consequência, o
Exército tomava conhecimento de
todas as atividades do Partido Comunista no Brasil.
Folha - Havia norte-americanos
interferindo em assuntos brasileiros?
Ibiapina - Elementos do consulado dos EUA às vezes me procuravam, porque eu era do sistema
de segurança do Exército, para saber o que acontecia. Um cônsul,
não me lembro o nome dele, me
procurou para saber se era verdade que eu havia permitido que um
preso fosse visitar a mãe que estava
doente. Ele queria saber se eu o havia deixado sair sem guardas de
Fernando de Noronha. Eu disse:
"O que o senhor tem a ver com
isso?". Perguntei, sabendo que ele
tinha aquilo que chamávamos de
"posição resguardante" da posição verdadeira dele no país. Eu já
sabia que ele era um dos agentes da
CIA.
Folha - O que o senhor fez na Escola das Américas?
Ibiapina - Em 1965, fui escalado
para fazer o curso na Escola das
Américas, no Panamá. Não tinha
polícia lá, só Forças Armadas. Não
ensinavam a matar gente. Aliás,
nesse aspecto, era uma escola muito fraca. Eles acreditavam muito
no informante pago, duplo. E o informante duplo não serve para a
segurança... Veja o paulista da
CIA, nós não pagávamos nada, e
ele nos informava.
Folha - A escola estava voltada
para o chamado "perigo comunista"?
Ibiapina - A escola era justamente para evitar a ação comunista. Mas, para mim, não serviu de
nada. Aquelas aulas eram para
quem não tinha curso de Estado-Maior, como eu tinha. A missão complementar que me deram
era estudar a Escola das Américas e
ver quais os cursos que interessavam ao Brasil.
Folha - Por exemplo?
Ibiapina - Por exemplo, não interessava ao Brasil o curso de
"rangers", que servia para verdadeiros Rambos. No tempo do governo Costa e Silva, eu fiz meu relatório sobre a escola. A escola devia ter a mão da CIA, mas meus
instrutores eram militares. Usavam como professores muitos elementos que haviam lutado no
Vietnã e elementos da Segunda
Guerra Mundial.
Folha - Falava-se em tortura?
Ibiapina - Eles recomendavam
muito cuidadosamente na escola
que não se batesse nos presos para
não invalidar o inquérito. Nunca
nos deram aula de terrorismo, mas
nos ensinavam como seguir gente
na rua. Era saber seguir sem ser
notado. Também tínhamos instruções sobre como interrogar e
como agir num teatro de operações, depois de uma explosão atômica. Mas todos os temas eram feitos em cima da figura de comandantes russos. Não tive instrutores
da CIA, mas nos EUA as agências
millitares são dirigidas pela CIA.
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