São Paulo, domingo, 24 de janeiro de 1999

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CINCO RAZÕES POR QUE O BRASIL VAI PARA TRÁS

GILSON SCHWARTZ
da Equipe de Articulistas

1. O Brasil não consegue estabilizar a economia
O fracasso do Plano Real condensa a tragédia brasileira. Seja qual for a interpretação para os descaminhos da política econômica, está quebrado o que se pretendia: criar um elo com o Primeiro Mundo que se resumiria à criação de regras estáveis. Até segunda ordem, voltamos ao salve-se quem puder. Em suma, continuamos sujeitos à lógica do "capitalismo selvagem".
2. Tem a pior concentração de renda do planeta
Excetuados os surtos de consumo depois de cada plano de estabilização, em geral situados estrategicamente próximos a eleições presidenciais, nada tem sido feito em favor de uma melhor distribuição de renda. Essa acaba por se tornar a mais alta muralha contra o desenvolvimento, pois apenas a perspectiva de um mercado consumidor em expansão sustentada daria razões para investimentos privados e base para a ampliação dos serviços públicos. Considerada nos últimos anos como a oitava economia mais rica do planeta, a sociedade brasileira ocupa a 62ª posição no Índice de Desenvolvimento Humano da ONU (índice que leva em conta alfabetização, expectativa de vida e outros indicadores sociais). Segundo o Mapa da Fome, elaborado em 1993 pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), do Ministério do Planejamento, são 32 milhões os brasileiros em situação de miséria.

3. Os indicadores de educação, ciência e tecnologia deixam muito a desejar
A crise no sistema de universidades federais é evidente, e os provões revelam um triste universo de faculdades privadas cujo compromisso maior é com o lucro, não com a educação. As empresas investem pouco em pesquisa, e o aumento na participação das multinacionais no bolo econômico resulta em manutenção dos centros de inovação no Primeiro Mundo.
4. A sociedade ainda exibe um nível baixo de auto-organização
Os estudos mais recentes sobre civilização e modernidade alertam para a relevância de fatores não-econômicos de desenvolvimento, entre os quais se destaca o associacionismo, ou seja, a capacidade das pessoas se organizarem independentemente do Estado. Ou seja, o desenvolvimento inclui a capacidade das pessoas alcançarem graus mais elevados de consciência coletiva e confiança mútua. Nessa área, os brasileiros ainda engatinham e o país continua uma geléia geral, mais próximo da "lei de Gerson" e do "jeitinho", formas cafajestes de alpinismo social e darwinismo político.
5. Tem um espaço público de baixa densidade
A fragilidade do espaço público é uma decorrência da baixa auto-organização da sociedade, mas é também um resultado de tradições luso-ibéricas de organização burocrática, além de ser um vício que ganha dinâmica própria, perpetuando-se sob mil disfarces. Da Justiça que não funciona ao serviço público destroçado, passando pela deterioração dos espaços urbanos e pela ampla desconsideração de direitos humanos, o Brasil é uma democracia incompleta. Nesse espaço público despolitizado, o Congresso Nacional é visto como antro de privilegiados. A mídia, sobretudo a televisão, substitui (induzindo) e às vezes simula (deturpando) o que seriam as funções da ágora (veja-se o mote daquele programa, "você decide").



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