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PONTO DE FUGA
A olhada do ouvinte
JORGE COLI
especial para a Folha em Nova York
"Monsters of Grace" é apresentada, na Brooklyn Academy of Music, como uma
"Ópera Digital em 3D". Não é
ópera: é antes algo que lembra
o antigo cinema mudo. Uma
grande tela, com imagens silenciosas em movimento,
acompanhadas por cantores e
uma pequena orquestra. As cenas, no cristal líquido, são digitalizadas e, com o auxílio daqueles óculos especiais, percebe-se o efeito de relevo e profundidade, muito eficaz. Robert Wilson, responsável pela
concepção visual, cria um
mundo lento e nítido, com objetos em espaços vastos, estranhamente iluminados, como
numa tela de Magritte.
A primeira sequência é a
mais poética, em que minúsculos personagens correm num
deserto e dois imensos pés descalços vêm se apoiar na areia.
Mas as possibilidades dessas
imagens simplificadas parecem se esgotar logo. Longe do
"Deafman Glance", cuja força hipnótica revelava, em 1970,
um autor inventando novos
caminhos para o teatro com
materialidade de efeitos e de
gestos como as inesquecíveis
negras gordas que cobriam o
palco de palha dourada, Wilson entra por um mundo asséptico e não muito fecundo. A
música é de Philip Glass, que
dirigia seu conjunto, parceiro
antigo de Wilson na célebre
"Einstein on the Beach". Tudo muito fácil e "new age",
cantos açucarados e agradáveis. O tom erudito, iniciático,
veio dos poemas de Rumi, autor árabe do século 13. Aos
poucos, algumas pessoas se foram. A maioria resistiu, aplaudindo polidamente no fim.
IDADE DE OURO - Nos
anos de 1950, houve uma explosão criadora nos Estados
Unidos. As artes plásticas renovavam-se radicalmente e,
num clima de efervescência
humano e intelectual, artistas
muito originais, buscando viver e produzir com intensidade, encontravam os meios para afirmarem-se. Bob Thompson foi um deles, mas que se
manteve, até hoje, diante do
público e da crítica, numa posição um pouco recuada.
Atualmente, uma retrospectiva de sua obra no Whitney
Museum permite avaliá-lo
melhor. Thompson era negro,
e morreu em 1966, com 29
anos, de overdose. Ele dialoga
com a história da arte por
meio de formas e tons que
lembram Gauguin, numa gama de intensidade mais forte.
Seu sentido cromático é verdadeiramente excepcional.
Com as cores, cria espaços,
destaca personagens, achata
superfícies ou aprofunda horizontes vertiginosos. Inspira-se
diretamente em Piero della
Francesca, Goya, Poussin e,
mesmo, "Anunciação", de El
Greco, que pertence ao Masp.
São conversas secretas entre
grandes artistas, vibrantes,
fortes, furiosas. Thompson
perfila-se entre os maiores,
numa época de gigantes.
CHIADOS - Ecos remotos,
em meio a ruídos diversos,
mas comoventes e mágicos. A
Music and Arts Program of
America possui um inestimável catálogo de CDs históricos.
"Guiomar Novaes Plays Chopin" é um dos últimos títulos.
Dois discos que trazem gravações inéditas, realizadas entre
1940 e 49, mais um recital ao
vivo, com os "Prelúdios". As
Sonatas nš 2 e nš 3, o Scherzo
nš 3, entre o vigor alucinado e a
profunda meditação, emergem
além da história e da técnica.
LUZES - Vik Muniz foi convidado pelo Metropolitan Museum of Art para inventar uma
exposição a partir das coleções
fotográficas do museu. Ele escolheu imagens de imagens,
percursos em túneis, eclipses
lunares maravilhosamente
captados em espelhos metálicos, retratos de cadáveres e de
espíritos manifestando-se
diante da câmera. A fotografia
mostra-se como falso testemunho, como enganosa transparência, criadora de objetos tão
frágeis quanto as lembranças
na memória.
Jorge Coli é historiador da arte.
E-mail: coli20@hotmail.com
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