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+(c)ultura
A velha senhora
Editora da "New Left Review", mais importante publicação de esquerda
e que está fazendo 50 anos, faz ressalvas ao governo Lula
CLAUDIA ANTUNES
DA SUCURSAL DO RIO
Os que cultivam a
credulidade não
devem abrir esta
revista.
O aviso caberia
na capa da "New Left Review",
que completou 50 anos no início deste ano cada vez mais
corrosiva em relação tanto a
seu velho nêmesis -"a ordem
capitalista e suas guerras"-
quanto sobre mudanças positivas com a ascensão de novas
potências, como a China.
Cética, mas não niilista.
Nascida como expressão de
intelectuais e ativistas anti-imperialistas e anti-stalinistas, a
NLR mantém a aposta num
modelo de organização social
"pluralista, igualitário e universalista".
Nele, segundo sua editora,
Susan Watkins, as necessidades do homem não são "reduzidas às do consumidor".
Watkins afirma que a internet fez bem à NLR -com circulação bimensal de 8.500 exemplares, dos quais mil são assinaturas de universidades, a revista tem 50 mil leitores regulares de sua versão on-line.
Possui ainda uma editora, a
Verso, que publica, entre outros, o historiador Perry Anderson, seu antigo editor, e o filósofo esloveno Slavoj Zizek.
Watkins frisa o pluralismo
dos colaboradores -"o critério
são ideias interessantes, críticas, pontos de vista não oficiais". Leia abaixo trechos da
entrevista que concedeu à Folha, feita por e-mail.
FOLHA - O que resta das bandeiras
políticas da época da criação da
NLR?
SUSAN WATKINS - O mundo dos
anos 60 -com seus movimentos anticolonialistas dinâmicos, seu espectro de diferentes
Estados dos trabalhadores, sua
vibrante cultura estudantil e
intelectual de esquerda- não
existe mais.
Mas felizmente muitos pensadores daquela época estão
conosco, produzindo críticas
ricas da política, da economia e
da cultura.
É um estímulo para jovens
radicais nas universidades, sindicatos ou movimentos de protesto poderem debater com
eles problemas de hoje.
FOLHA - Num editorial de 2000,
Perry Anderson chamou a esquerda
a compartilhar seu "registro lúcido
da derrota histórica". Seu último
editorial mantém o ceticismo e descarta como catalisadores de mudanças os movimentos "altermundialistas" surgidos nos anos 90. Em que
erraram?
WATKINS - O movimento "altermundialista" não desapareceu, mas não conseguiu dar origem a um movimento antiguerra vibrante, que fez muita
falta nos últimos dez anos. Nesse aspecto, se mostrou estéril.
Mas, claro, os governantes
mundiais caíram em silêncio
sobre as maravilhas da globalização neoliberal desde 2008.
FOLHA - Ficou surpresa com o fato
de a recessão causada pela crise financeira não ter provocado grandes
protestos nos países afetados?
WATKINS - A ausência de protestos de massa até agora foi estranha, mas talvez não surpreendente.
Por definição, os países mais
afetados pela crise -aqueles
em que a financeirização da
economia e a dependência de
serviços e bolhas imobiliárias
foram mais extremas- não
têm mais movimentos organizados de trabalhadores: Espanha, Irlanda, Grécia, Reino
Unidos e os próprios EUA.
Mas é muito cedo para dizer
que não haverá protestos, sob
qualquer forma.
É o caso do voto contra o Partido Democrata em Massachusetts [em janeiro], que o governo Obama certamente entendeu como um protesto contra
as políticas de Timothy Geithner na Secretaria do Tesouro.
Em segundo lugar, é muito
cedo para dizer o que acontecerá nas economias que estão indo bem: China, Índia, Brasil.
Qual seria o efeito de uma
crise de sobreprodução na China, se a recessão for combinada
com inflação alta? Teremos
que esperar para ver.
FOLHA - Em sua última entrevista,
à NLR, o sociólogo Giovanni Arrighi
[1937-2009] disse que preferiria não
chamar de socialismo um novo sistema mundial com mais igualdade
entre os homens e mais respeito pela natureza. Concorda com ele?
WATKINS - Os partidos que se
intitulam socialistas talvez tenham feito mais do que os conservadores para apoiar a ordem
capitalista e suas guerras, então
não surpreende que as pessoas
estejam enojadas. Um novo paradigma será construído por
um processo coletivo, não na
cabeça de alguém.
Mas, para ser efetivo, precisará ser pluralista, igualitário
(claro) e universalista -abraçando o conceito de desenvolvimento humano universal, ao
qual o capitalismo liberal, com
sua redução das necessidades
humanas às do consumidor, fez
tão mal.
FOLHA - Alguns colaboradores da
NLR veem a China como herdeira do
pior do capitalismo, enquanto outros ainda veem traços de socialismo. Qual é a sua opinião?
WATKINS - Os mais incisivos
críticos da China têm sido os
chineses, escrevendo do ponto
de vista dos trabalhadores e
camponeses.
Com certeza as esperanças
para uma China que era tanto
mais igualitária quanto mais livre e aberta foram esmagadas
na praça Tiananmen, em 1989.
Mas a questão sobre se o modelo econômico abraçado pela
liderança do PC chinês desde
1992 o trancou de maneira irrevogável no papel de "governanta dos EUA" ainda pode estar
em aberto.
FOLHA - A NLR tem sido crítica do
governo Lula. A senhora tem expectativas para o pós-Lula?
WATKINS - Lula parece ter levado o programa de modernização neoliberal de Fernando
Henrique Cardoso a um conjunto estranho de compromissos, entre o governo central e os
Estados, entre as grandes instituições financeiras e o trabalhador-consumidor.
Resta ver se esses compromissos constituem um novo
sistema duradouro, que pode
servir a quem quer que o suceda, ou se são dependentes de
haver um líder trabalhista como Lula na direção.
Mas a outra grande questão
é: o que vai acontecer à economia brasileira em 2011 ou 2012
-quão sustentável é o crescimento atual?
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