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Doente e cheio de injeções
Mal é internado em Villejuif, François Truffaut é autorizado a escrever aos pais, sabendo que as cartas enviadas ou recebidas serão obrigatoriamente abertas e lidas. Sua primeira carta ("Queridos papai e mamãe")
é escrita sem ódio nem emoção, é puramente prática. Ele pede aos pais
apenas alguns doces e suas fichas sobre Charlie Chaplin e Orson Welles.
Roland e Janine não entendem a "ausência totalmente cínica de arrependimento e remorsos" e interpretam esta frieza como um novo desafio.
Em consequência, não fariam visita alguma a Villejuif nos dois primeiros
meses.
O Centro de Observação de Menores é uma grande construção exteriormente protegida por altos muros escuros. Um amplo pátio, triste e cinzento, para os exercícios físicos, quase militares, dos adolescentes cercados por seus educadores. Salas de aula, um refeitório e um dormitório,
locais mantidos sob vigilância, onde são de praxe tanto castigos corporais quanto humilhações morais. O adolescente guardaria por
muito tempo na memória esta patética véspera de Natal: "Quatro
ou cinco biscoitos, uma barra de
chocolate, uma tangerina e nenhuma pancada nessa noite", escreveria à mãe.
De janeiro até o fim de março de
1949, François passaria a maior
parte do tempo em isolamento. O
aniversário de seus 17 anos seria
comemorado numa cela, de 5 a 8
de fevereiro, resultado de uma
tentativa de fuga e de "insultos a
um educador", impedido inclusive de receber no dia 6 a primeira
visita de sua mãe. Logo em seguida
ele passaria à enfermaria, pois os
médicos haviam detectado em seu
sangue, dias depois de sua chegada
a Villejuif, os germes da sífilis. A
frequência do bordel da rue de Navarin ou as relações sexuais já numerosas do rapaz terão sido a causa do problema. No pós-guerra, a
doença venérea, que minava o organismo com seus cancros e podia
levar em casos extremos à paralisia e à morte -"a Irreparável que
corrói com seu dente maldito", escrevia Baudelaire-, ainda era
uma doença relativamente comum. Graças à penicilina, entretanto, já pôde ser mais bem tratada a partir do início dos anos 40.
No dia 11 de janeiro, Truffaut chega à enfermaria para uma primeira
estada de uma semana. Receituário: sete injeções por dia, de três
em três horas, a partir das 6 horas
da manhã. Seguir-se-iam duas outras internações no fim de janeiro,
e novamente de 28 de fevereiro a 5
de março, a tal ponto que o doente
passaria a usar a injeção como
unidade de medida de seu tempo:
"Em seis dias, fui furado 38 vezes,
e espero receber "Paroles', de Jacques Prévert, antes das 38 outras
que estão por vir. Com livros a coisa vai melhor", escreve ele à mãe
no dia 8 de março.
continua
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