São Paulo, domingo, 29 de março de 1998

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Um filme contra o Brasil indiferente



O psicanalista Jurandir Freire Costa entrevista Walter Salles, diretor do filme "Central do Brasil", premiado com o Urso de Ouro do Festival de Berlim

Divulgação
Fernanda Montenegro (Dora) e Vinícius de Oliveira (Josué) em cena de "Central do Brasil", filme que deu à atriz o Urso de Prata de melhor intérprete feminina no Festival de Berlim


JURANDIR FREIRE COSTA
especial para a Folha

Na entrevista a seguir, Walter Salles fala de seu filme "Central do Brasil", premiado em Berlim com o Urso de Ouro de melhor filme e com o Urso de Prata de melhor atriz. Com serenidade e entusiasmo, ele defende o compromisso do cinema com valores morais, mas sem querer fazer de seu estilo de pensar paradigma do fazer do outro. Em sua opinião, a maior qualidade da cinematografia brasileira é a pluralidade das tendências movida pela mesma fome de cinema. Esta é a linguagem comum, e o menos aqui é mais.
"Central do Brasil" retoma o projeto que fascinou o Cinema Novo: mostrar o Brasil escondido ao Brasil oficial. Os personagens que partem em busca do país, do pai ou das emoções perdidas vão revelando, no mesmo movimento, o mais íntimo de si e o mais íntimo de uma terra que amedronta e seduz. Depois da viagem, não serão mais os mesmos. A apatia converte-se em ação, a indiferença em solidariedade e o desprezo em confiança. Como em toda bela fábula moral, "Central do Brasil" não se preocupa em doutrinar. Contenta-se em mostrar, sugerir e convidar a quem quiser para que vá e veja. Em seguida, a cada um segundo sua vontade e de cada um segundo sua possibilidade.
Hannah Arendt disse, certa vez, que a modernidade ocidental abandonou a grandeza pública da Antiguidade pelo encantamento das emoções privadas. Num momento em que o público e privado parecem ter perdido o sentido, Walter Salles consegue fundir grandeza e encantamento num filme terno, lírico e humanamente aberto ao mundo. Poucos são capazes disto; poucos conhecem o valor disto.



continua




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