São Paulo, Domingo, 30 de Janeiro de 2000 |
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+ 3 questões Sobre manipulação genética 1. O que significa a decodificação do genoma humano? 2. A decodificação vai erradicar as doenças hereditárias? 3. Qual a melhor política de controle da manipulação genética? Andrew Simpson responde 1. O genoma humano é o conjunto de todo nosso material genético contido nos cromossomos, presente em todas as nossas células. Ele é composto de uma matéria química chamada DNA. O DNA é uma substância composta de unidades químicas repetidas de forma linear cerca de 3 bilhões de vezes no genoma humano. As unidades são de quatro tipos: A, C, G e T. É a ordem dessas unidades que confere seu poder de informação. Em partes do genoma -em menos de 3% dele- o DNA codifica uma proteína. Essas regiões codificadoras de proteínas se chamam genes. A estrutura das proteínas, sintetizadas na célula por estruturas sob o comando da informação dos genes, é definida por grupos de três unidades no DNA. Os outros 97% do genoma humano provavelmente têm pouca importância, mas ainda podem surgir surpresas. Estima-se que o genoma humano contenha de 50 mil a 100 mil genes, isto é, que codifica de 50 mil a 100 mil proteínas diferentes, as quais formam as nossas estruturas corporais e controlam as nossas atividades biológicas, da digestão à faculdade de pensar. São pequenas alterações nessas proteínas que resultam na variabilidade humana. Através de dois projetos de pesquisa, um no setor público e o outro no privado, a ordem de cerca de 90% das unidades A, C, G e T no genoma humano já é conhecida. Agora é necessário identificar os genes dentro do genoma e depois definir as funções das proteínas. O sequenciamento estará completo este ano, mas a identificação dos genes precisará de mais cinco anos. Já a definição de suas funções provavelmente estará em progresso nos próximos cem anos. 2. O conhecimento de todos os genes permitirá a identificação daqueles que estão associados a doenças hereditárias, quando alterados numa forma deletéria. No futuro próximo, testes de DNA permitirão a identificação de indivíduos portadores de doenças hereditárias. Essa informação pode contribuir para a erradicação das doenças por meio de aconselhamento genético. 3. A manipulação genética tem de ser controlada por legislação nacional, definida pelo consenso de toda a sociedade. Glaci Zancan responde 1. Significa que nós passamos a conhecer 90% das sequências do DNA sem contudo conhecermos ainda a ordem e a função da maioria delas. Na realidade o que interessa é o genoma funcional, ou seja, a mobilização da informação contida no grande banco que é o DNA. Do conhecimento do genoma funcional é que poderemos modelar novos medicamentos, estabelecer métodos de diagnóstico, corrigir erros genéticos e interferir nos processos básicos do funcionamento do organismo. Logo, estamos apenas iniciando uma longa caminhada. 2. Neste momento a erradicação de doenças hereditárias é uma utopia. A tecnologia de DNA recombinante é uma ferramenta fantástica, e a rapidez das descobertas é assustadora. Por isso as esperanças para resolver os problemas de doenças hereditárias são maiores. O esclarecimento dos erros genéticos de doenças conhecidas vai permitir terapias específicas para cada caso. A terapia genética é experimental e apenas está começando. É importante, no entanto, destacar que as doenças decorrentes da pobreza matam mais, e nós temos tecnologia para combatê-las. O que falta é decisão política para enfrentar a desigualdade social. 3. O controle da manipulação genética deve ser da sociedade como um todo. Pesquisadores, empresas e agências governamentais que financiam os projetos estão envolvidos no processo e não devem ser os únicos a ditar as normas de conduta sobre o futuro da população. É preciso educar a sociedade para que ela seja capaz de entender a revolução que o conhecimento do genoma humano dará. É preciso pensar na privacidade das informações que a técnica facilitará. Por exemplo, como reagirão as empresas de seguro de saúde se souberem que um segurado poderá vir a ter uma doença progressiva? Como reagirão as empresas se souberem que um candidato a emprego é suscetível de adquirir uma doença no ambiente de trabalho? Há hoje uma grande discussão sobre o patenteamento das sequências de DNA. A patente é uma reserva de mercado, e isso significa que a empresa terá o domínio econômico sobre todas as descobertas futuras. É fundamental que se reveja o sistema de patentes na área biológica, do contrário a humanidade ficará cativa de umas poucas empresas. QUEM SÃO Andrew Simpson Especialista em biologia molecular, Simpson é chefe do Laboratório de Genética de Câncer do Instituto Ludwig de Pesquisa sobre Câncer e também coordena o Projeto Genoma Humano de Câncer. Glaci Zancan Professora titular de bioquímica da Universidade Federal do Paraná. Foi presidente da Sociedade Brasileira de Bioquímica e diretora do Centro Brasileiro-Argentino de Biotecnologia. Texto Anterior: Os dez + Próximo Texto: José Simão: Morumbi Fashion! Moda-cabeça é boné! Índice |
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