Juiz é investigado por dirigir carro apreendido de Eike Batista
Magistrado diz que levou para casa Porsche de R$ 495 mil que iria a leilão por ser local seguro
Corregedoria do TRF apura conduta do juiz; advogado de Eike afirma que entrará com processo no CNJ
O juiz Flávio Roberto de Souza, titular da 3ª Vara Federal Criminal do Rio, foi flagrado, na manhã desta terça-feira (24) dirigindo o Porsche Cayenne do empresário Eike Batista, apreendido pela Polícia Federal no início do mês. A Corregedoria do Tribunal Regional Federal investiga a conduta do magistrado.
É a primeira vez, no Estado do Rio, que um juiz federal é flagrado utilizando um bem apreendido de um réu em processo sob sua responsabilidade. O Porsche foi avaliado em R$ 495 mil.
Souza é responsável pelos processos em que Eike responde por supostos crimes de "insider trading" (negociação de ações com informação privilegiada) e manipulação de mercado, na venda de papéis da OGX e da OSX.
Advogado de Eike, Sérgio Bermudes disse que entrará com processo no CNJ (Conselho Nacional de Justiça).
Souza se defendeu. "É uma situação normal. O carro ficou guardado em local seguro, longe de ser suscetível a qualquer dano" (leia ao lado).
O juiz responde ainda a processo que questiona sua imparcialidade e pede seu afastamento da ação penal, impetrado pela defesa de Eike, após ter dito que o empresário era "megalomaníaco" e que o caso era "emblemático". Dar opiniões sobre processos é proibido pela Lei Orgânica da magistratura.
O caso do Porsche criou mal-estar entre juízes e desembargadores federais.
Desembargadores do TRF ouvidos pela Folha e que pediram que não fossem identificados dizem que o juiz feriu regras da Lei Orgânica da magistratura, do Código de Processo Civil e da Lei de Improbidade Administrativa.
Nenhuma delas prevê explicitamente uso de bens apreendidos por magistrados. Há entendimento de que o juiz não pode "ter à sua disposição os bens de um réu".
Quando um bem é apreendido, o juiz deve eleger um "fiel depositário" para resguardá-lo e impedir sua deterioração.
Souza solicitou ao Detran, no dia 11, que o Porsche e um Hilux, também de Eike, ficassem à disposição do juízo.
À garagem do condomínio em que mora o juiz, além do Porsche, foi levado uma Land Rover de Thor, filho de Eike. Souza disse ter nomeado um morador do condomínio como fiel depositário do carro.
"O bem apreendido não fica em poder do juiz, mas da Justiça. Num ato de insanidade, ele afrontou a lei. Levou o Porsche para sua própria casa", afirmou Bermudes.
"A PF não tinha depósito seguro e lá ficaria exposto ao sol, chuva e possíveis danos. Como eu queria o carro em bom estado de conservação, levei para uma vaga coberta [no prédio onde mora]. Não levei para usar, só para ficar guardado", disse o juiz.
O CASO
Souza decretou, no início do mês, bloqueio de R$ 3 bilhões em bens de Eike, dos filhos Thor e Olin, da ex-mulher Luma e da mulher Flávia. O valor seria usado para pagar indenizações, caso o empresário seja condenado.
Em seguida, o juiz mandou apreender carros e outros bens de Eike. Souza planeja leiloar todos os bens, alegando necessidade de preservar os valores. O primeiro leilão, que ofertaria uma Lamborghini e outros carros, previsto para esta quinta (26), foi suspenso por ordem da Justiça.