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Vinicius Torres Freire

O circo da eleição está vazio

Cresce a velha e conhecida disparidade entre decisões de governo e o "mundo da vida", política ou social

AS ELEIÇÕES cada vez mais vazias de debate político ainda inflamam aquelas poucas pessoas que muito se interessam por política.

Não se trata de dizer que eleições, seus resultados e suas emanações miasmáticas, sejam desprovidas de conteúdo.

Mas o conflito ideológico que ousa dizer seu nome se restringe a margens sectárias. Por exemplo, aos partidos extremistas internéticos, à "nova direita", aos "blogueiros de esquerda", essas coisas. Mas quem, que interesse social organizado, tais seitas representam?

Onde estão os "conflitos reais"? Ainda é engraçado ouvir "blogueiros de esquerda" a dizer que "a grande mídia, tucanos etc." são amigos do grande capital. Muito "blogueiro de esquerda" é petista ou simpatizante. Mas desde quando os governos petistas são "inimigos do grande capital"?

Os governos do PT, assim como os do PSDB, trataram de reorganizar a atividade, a propriedade e os meios de aumentar ou preservar a rentabilidade do grande capital.

O povo mais miserável jamais teve partido, formal ou informal, afora tentativas como o MST leninista, que minguou devido a benefícios sociais e à economia melhorzinha.

O PT foi um dia outra coisa, uma breve aliança entre os últimos crentes intelectuais da grande política de esquerda com uma certa elite operária e missões católicas, os "movimentos sociais".

Não se trata de repetir a velha e ingênua crítica da "falta de base social" dos partidos brasileiros. Mas de observar que as decisões relevantes de governo estão cada vez mais insuladas, restritas à conversa entre grupos de burocratas do Estado e grupos de interesse.

"Bidu", dirão politólogos, "outra ideia velha", pois a massa é em geral desorganizada. Decerto. Mas o descasamento entre o "mundo da vida real" e o das decisões relevantes torna-se radical. Não é assim em todo lugar. Um exemplo simples é o debate amplo sobre tamanho do Estado na eleição americana.

Outro embate ora mais evidente é aquele entre economistas-padrão, "ortodoxos", e parte dos governos petistas. Mas esses "partidos" representam quem?

Considere-se a massa de pessoas algo acima da miséria e bem abaixo da elite. Essa que vinha sendo chamada de eleitora-consumidora, em especial a parcela de opiniões mais autoritárias. É um prato cheio para um partido direitista.

Mesmo políticos "de direita" não a cultivam. Fazem apenas biscates na temporada eleitoral. Não parece haver um interesse organizado de enquadrar essa massa de baratas tontas "de direita" num movimento conservador.

Mas conservador de quê? Para quem? Não somos enfim sistematicamente conservadores, fazendo remendos até a corda estourar?

No entanto mudamos um pouco, com FHC ou com Lula. Trata-se do paradoxo de Zeno da política brasileira (é sarcasmo). Parece que não temos como avançar, que os movimentos sociais ou da sociedade não se movimentam.

Porém, burocratas e/ou intelectuais no Estado levam as coisas para lá ou para cá, de acordo com modas e acidentes do tempo e com quem tem cadeira no parlatório do governo. Mas isso tem muito pouco a ver com partidos, grupos ou movimentos sociais organizados num conflito identificável.

vinit@uol.com.br

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