São Paulo, quinta-feira, 02 de dezembro de 2010

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VINICIUS TORRES FREIRE

Turismo da crise: de volta à Europa


Após os quebrados Irlanda e Grécia, Portugal, Bélgica, Espanha e Itália são levados ao paredão dos mercados

PESSOAS COM mais a fazer do que acompanhar idas e vindas das finanças internacionais acham engraçado ou francamente ocioso prestar atenção às manhas dos mercados em relação às dívidas grega ou irlandesa. Mas as crises europeias mais e mais estão com jeito de que vão dar em besteira.
O mundo não vai parar por causa disso, de rachaduras na eurozona, nem a economia brasileira é tão frágil que espirros no Atlântico Norte nos provoquem pneumonia. Basta notar que o país escapou do colapso muito mais grave de 2008. Mas não precisamos de más notícias lá fora, ainda mais num período em que o país tem alguns problemas a resolver, problemas que demandam atitude mais urgente do que a vista nos anos de folga e de bonança do governo Lula. Batem à porta temas como inflação, gasto público no limite, câmbio e infraestrutura esgotada.
Para início de conversa, note-se que governos e/ou mercados costumam menosprezar os sinais de fervura do leite financeiro, que acaba derramado e queimado. Em dezembro de 2009, a crise da dívida grega era ainda piada para as pessoas mais ou menos normais. O recém-eleito governo socialista grego dizia que "não iria ao FMI". Bem, o país apenas não quebrou de maneira operística em março deste ano porque o Banco Central Europeu começou a financiar ou dar garantias indiretas à dívida grega e aos bancos europeus nela pendurados; além do mais, criou-se um fundo de cobertura de calotes perto do qual o dinheiro do FMI era troco -o Fundo de Estabilidade Financeira da Europa.
Os custos de financiamento das dívidas públicas de Grécia, Irlanda e Portugal desde então foram à órbita da Lua e por ali ficaram.
Então, em março, havia rumores sobre Portugal e Irlanda. O fundo europeu jogou água na fervura ibérica. Além do mais, dizia-se que a Irlanda "era confiável", "que fazia a dura lição de casa", talhando gastos públicos sem dó. O resto da conversa fiada foi a Europa dizer que os bancos da eurozona estavam em ordem, que haviam passado nos "testes de estresse". Bem, os bancos irlandeses estavam tão podres que levaram o governo irlandês à breca. Em novembro passado, a Irlanda quebrou, de modo eufemístico.
Agora voltam os rumores sobre Portugal. O governo espanhol diz que suas contas são "sólidas". Começaram rumores sobre a Itália. Grécia e Irlanda podem quebrar num sussurro, mas o caso de Itália e de Espanha seria um estouro. O custo de financiamento das dívidas italiana e espanhola subiu para níveis nunca antes vistos na era do euro.
Os países do sul da Europa, Irlanda e Bélgica estão pendurados em dívidas. Arrocham suas economias para pagá-las, arrocho que reduz receitas. Além do mais, são países em geral pouco "competitivos": não têm como começar a sair da estagnação por meio de exportações. Um relaxamento monetário à moda dos EUA, com desvalorização da moeda, poderia ser uma solução. Mas esses países não podem fazer tal coisa, pois não têm moeda nem política monetárias nacionais.
Enfim, parte da Europa padece simultaneamente de arrocho, recessão ou quase, desemprego nas alturas e de desconfiança dos mercados, de seus credores, que cobram os olhos da cara em juros para financiar as dívidas dos governos. Isso tem cara de círculo vicioso.

vinit@uol.com.br


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