São Paulo, domingo, 06 de fevereiro de 2011

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De cada 10 litros de leite, 3 não são inspecionados

Para pequeno produtor, venda informal é mais lucrativa; fiscalização é falha

Pizzarias de SP são campeãs do consumo de produto sem inspeção, diz entidade; leite ilegal traz riscos à saúde

Silva Junior/Folhapress
Leite não inspecionado em garrafas pet, vendido
de porta em porta em Ribeirão Preto


JULIANA COISSI
DE RIBEIRÃO PRETO

Três anos após o escândalo que pôs em xeque a qualidade do leite no Brasil, o setor ainda tem problemas. A cada 10 litros produzidos, 3 não passam por inspeção.
Os últimos dados anuais fechados revelam que 9,5 bilhões de litros produzidos em 2009 (33% do total) não passaram pelas autoridades sanitárias, segundo o IBGE.
Os números mostram pouco avanço na fiscalização desde 2007, quando a Polícia Federal deflagrou uma operação que encontrou soda cáustica e água oxigenada adicionadas ao leite.
Naquele ano, 8,2 bilhões de litros (31,5%) de leite ou derivados foram consumidos pelos brasileiros sem qualquer fiscalização sanitária. A repercussão chegou a atingir gigantes, como a Parmalat, e a Anvisa interditou lotes.
O leite informal e ilegal vem geralmente do pequeno produtor, que não conseguiu bom preço na cooperativa e decide vender no varejo.
"Sempre vai haver esse leite informal se a inspeção dos governos não tomar uma atitude e passar a fiscalizar e multar", afirma Jorge Rubez, presidente da Leite Brasil (Associação Brasileira dos Produtores de Leite).
Vendido em garrafas pet ou transformado em queijo, esse leite não inspecionado é levado diretamente ao consumidor ou é entregue em feiras livres, quitandas e outros comércios. "Campeãs de consumo de queijo informal são as pizzarias de São Paulo", diz Rubez.
O preço atrai: o litro vendido ao laticínio rende ao produtor de R$ 0,60 a R$ 0,65, segundo pecuaristas ouvidos pela Folha. Na garrafa pet, sai por até R$ 1,30. A peça de queijo, que consome cerca de oito litros, é vendida a R$ 10.

LUCRO MAIOR
A vantagem econômica afastou do laticínio Wilson Couto Rosa Júnior, 57, produtor de leite há 40 anos no interior paulista.
Em 2002, ele decidiu deixar a cooperativa e assumiu a "clientela" de um vizinho. Hoje são 40 fregueses. Ele vende até 50 litros de leite por dia (a R$ 1,25 cada) e ainda faz 20 queijos por semana, que rendem R$ 200.
Se, como cooperado, sobrava renda de R$ 1.000 por mês, como autônomo Wilson obtém o dobro.
Todos os dias, ele sai de casa antes das 7h para entregar as garrafas. O horário cedo é devido à perecibilidade do produto, mas também para evitar fiscais. "É inviável vender para laticínio. A gente faz isso para a sobrevivência."
Outros produtores usam o leite informal como complemento. Um deles em Ribeirão Preto, que pediu para não ser identificado, entrega de 100 a 120 litros por dia ao laticínio, a R$ 0,60. O que sobra (de 30 a 40 litros) vende na rua, a até R$ 1,30, ou transforma em queijo.
"A pessoa que compra da gente sabe que é bom. Prefere o leite natural, puro. O que fazer o pequeno produtor se não puder vender leite na rua?", pergunta.
A falta de inspeção traz riscos à saúde. "Às vezes [o leite] nem sequer passa por pasteurização e, com isso, corre-se o risco de bactérias patogênicas", diz Laerte Cassoli, da Clínica do Leite da USP.
O Ministério da Agricultura e as secretarias da Agricultura de Estados produtores dizem que há falha nas três esferas (inclui prefeituras).


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