São Paulo, segunda-feira, 07 de março de 2011

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros

MARIA INÊS DOLCI

Cartão amarelo para serviços


Os consumidores devem se mobilizar, denunciar e não aceitar os abusos nos serviços financeiros


OS SERVIÇOS FINANCEIROS estão sempre no topo das reclamações dos consumidores. Os motivos são vários: débitos não autorizados, esclarecimentos incompletos ou incorretos, cobrança de serviços não contratados, dentre outros.
Não é fácil para o correntista lutar contra instituições financeiras, que lucram bilhões de reais, dominam a economia e têm grandes equipes jurídicas à disposição.
Conscientes dessa supremacia, o Executivo, o Legislativo e o Judiciário são extremamente cordatos com bancos, com seguradoras e com operadoras de cartões de crédito.
Logo, sobram para defender o cidadão as entidades públicas e privadas de defesa dos seus direitos, alguns abnegados juízes e promotores, e raros parlamentares.
Foi por isso que a Consumers International, organização mundial de defesa dos direitos dos consumidores, propôs cartão amarelo (advertência na linguagem futebolística) para as instituições financeiras no próximo dia 15 deste mês.
Nessa data, é comemorado o Dia Mundial do Consumidor, e a mobilização será por serviços financeiros mais justos.
O desequilíbrio é mundial, mas se sobressai em países como o Brasil, em que os bancos até tentaram ser excluídos -e quase conseguiram- da abrangência do Código de Defesa do Consumidor (CDC).
O Banco Central, principal normatizador da área, costuma arbitrar em favor dos bancos e das operadoras, na maioria das vezes em que há confronto com os clientes. Sofreram muito, com essa visão, os mutuários que contraíram financiamento habitacional e foram lesados por artimanhas como a correção do saldo devedor antes do abatimento da prestação paga.
Nos últimos anos, por pressão da sociedade e das entidades de defesa do consumidor, houve alguns avanços, ainda tímidos, como a regulamentação das tarifas bancárias e a exposição, no site do Banco Central, dos nomes das instituições financeiras com mais reclamações.
Uma situação das mais desagradáveis, em franco crescimento, é a ação das agências bancárias sobre seus correntistas. Gerentes de conta pressionam os clientes a fazer seguros e a adquirir outros produtos e serviços bancários.
Fica implícito que, sem essa reciprocidade, cairá o nível do serviço recebido pelo cliente. Há até os apelos desses profissionais, aos correntistas, para que possam cumprir suas metas de vendas.
Os custos dos pacotes de tarifas são muito elevados, mas tendem a se tornar gratuitos justamente para quem tem mais dinheiro e mais investimentos financeiros. Os consumidores de menor renda, bem, esses têm grande dificuldade até para abrir uma conta, e são convidados a usar os serviços das agências dos correios e das casas lotéricas.
Os bancos públicos, que tinham um foco mais social, hoje trabalham como instituições comerciais, e isso se reflete, por exemplo, nas exigências que fazem a agricultores para renovar o crédito rural. Ou seja, que adquiram seguros de vida, cartões de crédito, etc.
É importante que os consumidores não aceitem os abusos nos serviços financeiros. Que se mobilizem, denunciem, cobrem, exijam seus direitos. E que recorram aos Procons e às entidades privadas que os defendem, porque o poder financeiro conquista, diariamente, mais espaço.
Antes que algum adepto do "legislativismo" sugira mais leis para enquadrar os bancos, saliento que o CDC já tem o que é necessário para proteger os consumidores.
A questão não é legal, mas sim de aplicação da lei e de punição aos que desrespeitem o que está estipulado no CDC.
Temos de avançar muito, ainda, para que os bancos ajam de acordo com o que mostram suas propagandas, em termos de relacionamento com seus públicos e cidadania empresarial.
Isso tem de funcionar também nas agências reais e nas virtuais.
Muitas empresas financeiras merecem cartão vermelho pela forma como tratam correntistas e não clientes. Vamos discutir muitas dessas questões no próximo dia 15, mas esse debate, certamente, terá de ser prorrogado para bem além dos 90 minutos de jogo.

MARIA INÊS DOLCI, 54, advogada formada pela USP com especialização em business, é especialista em direito do consumidor e coordenadora institucional da ProTeste Associação de Consumidores. Escreve quinzenalmente, às segundas, nesta coluna. Internet: mariainesdolci.folha.blog.uol.com.br

AMANHÃ EM MERCADO:
Nizan Guanaes



Texto Anterior: Paulista mantém liderança
Próximo Texto: Marcas apostam em design personalizado
Índice | Comunicar Erros



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.