São Paulo, terça-feira, 08 de junho de 2010

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Restrição muda composição do Chanel nº 5

Entidade limita uso de ingredientes em perfumes para proteger consumidor

REBECCA JOHNSON
DO "FINANCIAL TIMES"

A fragrância é pessoal; cria identidade e produz recordações. Mas e se, um dia, a fragrância à qual você tiver se apegado -ou aquela que evoque um momento significativo de seu passado- mudar subitamente?
Não é uma questão teórica. A cada ano, mais ingredientes e o volume em que podem ser usados pelos perfumistas ficam sujeitos a restrições impostas pela Ifra (Associação Internacional de Fragrâncias), a organização setorial do setor de perfumes.
Os regulamentos da Ifra para 2008, por exemplo, limitam ingredientes essenciais a muitas fragrâncias, por reclassificá-los como alergênicos.
O musgo de carvalho, usado no Mitsouko, da Guerlain, entre outros, agora tem seu uso restrito; o mesmo se aplica ao jasmim, ingrediente de fragrâncias como o Chanel nº 5, e ao ylang ylang.
A Ifra foi fundada em 1973 pelo setor de fragrâncias a fim de garantir a segurança dos materiais utilizados pelos fabricantes.
Mas por que a fabricação de perfumes requer fiscalização tão estreita? Jean-Pierre Houri, presidente da Ifra, explica o problema: "A saúde dos consumidores está se tornando mais importante. Não fazemos [a regulamentação] pelo prazer de impedir nossos criadores [de produzirem suas fragrâncias]; o fazemos porque desejamos ser responsáveis".

CRÍTICAS
Para alguns, essas limitações são supérfluas e parecem ter sido adotadas sem causa plausível, como no caso de Tania Sanchez, coautora de guia sobre perfumes. "[A Ifra] vem restringindo muitas coisas usadas há décadas em perfumes e que nunca causaram danos perceptíveis às pessoas", diz.
"O Mitsouko, da Guerlain, e o Joy, da Jean Patou, dois clássicos que nosso guia define como obras-primas, certamente foram reformulados para seguir as recomendações da Ifra", afirma.
"Os regulamentos quanto aos alergênicos se tornaram uma maldição."
Os "artistas" saem perdendo e fragrâncias famosas podem sair do mercado. Não vai demorar, diz o perfumista e especialista em fragrâncias Roja Dove, "para que grandes criações deixem de existir em sua forma original porque a lei não o permitirá. É como se um artista fosse proibido de usar o tom carmesim em seus quadros e por isso instruído a mudá-los".

ALMA DA ARTE
Christopher Sheldrake, diretor de desenvolvimento de fragrâncias da Chanel, está entre os que temem que as decisões da Ifra estejam mudando a alma de sua arte. "É como dizer que comida grelhada faz mal", afirma.
"Quando você considera que ela existe há milhões de anos e todos já a comeram, é difícil não imaginar que o perigo talvez não seja tão grave."
A Chanel reformulou algumas de suas fragrâncias, enquanto procura substitutos para ingredientes que já não podem ser usados. "A regulamentação cria muito trabalho para que consigamos manter a qualidade de nossos produtos existentes."
Talvez o admirável mundo novo das fragrâncias venha a propiciar benefícios.
"Eu procuro ser sempre otimista", diz Dove. "Estão surgindo criações que serão o que são porque é assim que os perfumistas trabalham com o agora."
Ou seja, quando um ingrediente é proibido, isso força novos saltos de criatividade.
Haverá um "renascimento" para o setor de perfumaria quer ele goste, quer não.


Tradução de PAULO MIGLIACCI


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