São Paulo, sexta-feira, 11 de junho de 2010

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RODOLFO LANDIM

Momento de decisão


Chegou a hora de mostrar à sociedade se, aos olhos do CNPE e de Lula, o Brasil é ou não maior que a Petrobras

ATÉ 1997 a Petrobras deteve o monopólio estatal do petróleo e cabia unicamente a ela avaliar o potencial petrolífero dos 5,5 milhões de km2 das bacias sedimentares brasileiras, uma área de extensão quase continental.
Nesse período, a Petrobras fez um grande esforço para cumprir esse papel. No entanto, como a maior parte dos recursos dedicados à exploração do já apertado orçamento era direcionada para as áreas com os melhores resultados, muito pouco acabava restando para a exploração de novas fronteiras. O resultado é que chegamos a 1997 com várias bacias sedimentares pouquíssimo exploradas.
A partir daí, com a criação da ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis), iniciaram-se as rodadas de licitação anuais para oferta de blocos exploratórios, um trabalho técnico muito equilibrado e bem conduzido que vinha permitindo a atração de investimentos para o setor.
Porém, com a descoberta do pré-sal e o seu enorme potencial, tudo mudou. Áreas de grande potencial da 8ª rodada do leilão deixaram de ser homologadas, outras de águas profundas foram retiradas da 9ª rodada, apenas foram oferecidas áreas terrestres na 10ª rodada e a 11ª, prevista para o final do ano passado, nem ocorreu.
Nessa nova fase, a Petrobras trabalhou forte, fazendo uso do seu peso político por meio de sua influência técnica nas decisões do governo (três dos mais importantes ministros do país participam do seu Conselho de Administração) e da sua credibilidade no Congresso.
Com isso, ela conseguiu que nos projetos de lei em tramitação fosse a única empresa operadora do pré-sal, além de garantir no mínimo 30% de participação nessas áreas que são vistas como o filé mignon no Brasil.
A lógica é que a Petrobras venha trabalhando silenciosamente contra os leilões.
Primeiro porque hoje ela já luta com dificuldades para arregimentar recursos a fim de cumprir o programa exploratório das áreas que tem em mãos. Isso pode ser visto pelos diversos pedidos de prorrogações de prazos de exploração dessas áreas junto à ANP, fato que só se agravará com a futura operação de todas as áreas do pré-sal. Adquirir novas áreas de menor potencial em futuros leilões só seria uma dor de cabeça a mais com menor retorno esperado.
O segundo ponto é que, mesmo não tendo interesse em novas áreas, é natural que a Petrobras não queira dar espaço a concorrentes.
Contudo, a ausência de leilões não será boa nem para a Petrobras nem para o Brasil. Primeiro porque a exposição à "concorrência" até hoje só fez a empresa ficar mais forte. Adicionalmente, isso irá afastar novos investimentos de outras petroleiras, impedindo até que novas histórias de sucesso, como a da OGX, empresa criada com blocos da 9ª rodada e que já se encontra em forte operação, possam surgir.
Por fim porque, sem leilões, toda uma indústria de prestação de serviços na área de exploração que florescia e hoje passa por sérias dificuldades será exterminada.
Na semana passada, o diretor-geral da ANP defendeu publicamente a necessidade de realização de novos leilões envolvendo centenas de blocos em terra e em águas rasas e profundas fora do pré-sal.
Além disso, informou que o CNPE (Conselho Nacional de Política Energética, órgão de assessoramento ao presidente da República que tem entre seus princípios a ampliação do mercado de trabalho, a promoção da livre concorrência e a atração de investimento e no qual a Petrobras também tem assento) irá se reunir neste mês para acatar ou não as indicações da ANP.
Certa vez, quando trabalhava na Petrobras, ao chegar a uma reunião de trabalho com o presidente Lula, ele me cumprimentou e perguntou: "Como vai aquele seu país?". A fina ironia envolvia não só as diferenciadas condições de trabalho e a tecnologia utilizada pela empresa mas certamente também a sua independência de atuação.
Os interesses da Petrobras são importantíssimos, mas chegou a hora de mostrar à sociedade se, aos olhos do CNPE e em última análise do próprio presidente Lula, o Brasil é ou não maior do que a Petrobras.


RODOLFO LANDIM , 53, engenheiro civil e de petróleo, é conselheiro da Smith International e da Wellstream. Trabalhou na Petrobras, onde, entre outras funções, foi diretor-gerente de Exploração e Produção e presidente da Petrobras Distribuidora. Escreve quinzenalmente, às sextas, nesta coluna.


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