São Paulo, quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

VINICIUS TORRES FREIRE

A banalidade do Lula x FHC


País avançou sob Lula e FHC; atribuir baixo crescimento ao governo fernandino apenas é uma crítica burra


HÁ MUITA crítica séria a fazer ao governo FHC. Mas sobrevem o torpor do desânimo quando se ouve a conversa de Dilma Rousseff e de petistas em geral sobre a economia ainda hoje crescer pouco devido à "herança maldita" fernandina.
Não é o caso de dizer que a crítica não tenha fundamento ou que os petistas sejam descarados ao empurrar a responsabilidade para os tucanos, dado que já estão no poder faz sete anos. O problema é que discutir crescimento demanda tanta atenção a matizes políticos e técnicos, além de reflexão sobre a história, que acusações tão toscas como a da candidata petista parecem má-fé ou ignorância, paranoia ou mistificação. Tucanos fazem a mesma coisa em relação aos petistas, mas noutros aspectos da pendenga.
Quase uma década depois do fim dos anos FHC, uma análise menos apaixonada do governo tucano sugere que teria sido difícil o país crescer mais do que os míseros 2,3% da média anual de 1995 a 2002 (ante 3,6% de 2003-09, e provavelmente 4% no final do governo Lula). FHC foi "vítima das circunstâncias"?
Sim e não. FHC começou a governar sob inflação caótica e economia desorganizada, empresas ineficientes, estatais apodrecidas, sistema bancário em parte quebrado, dívida externa ainda assombrosa, descrédito financeiro mundial etc.
Governou durante um tumulto quase contínuo na economia mundial (crise de 1994-95 no México, na Ásia em 1997, na Rússia em 1998, na Argentina e nos EUA em 2001 e 2002); durante um período em que o mercado mundial pagava pouco pelos produtos brasileiros de exportação. Era ainda muito forte o conflito político e social a respeito de medidas óbvias de racionalização do Estado e de contenção de gastos inviáveis, medidas de "interesse geral", ao menos no curto e médio prazos.
Os "erros" de FHC elevaram à potência vários desses problemas. "Erros" entre aspas: decisões de governo, quase todas, não podem ser medidas pelo metro de um manual de política pública. São decisões interessadas, que têm tal ou qual consequência, com efeito variado sobre cada parte da sociedade. Sim, obviedades sociológicas, esquecidas nestes tempos de economicismo.
Alguns desastres foram óbvios. A reeleição, que adiou a resolução de problemas macroeconômicos sérios. O apagão, que danou o crescimento de um ano e dos seguintes, pois a crise de energia exigiu juros ainda mais altos e multiplicou a dívida. Houve o descaso arrogante e catastrófico com as contas externas, houve a manipulação errada do câmbio, abertura comercial malfeita e outros problemas devidos a fetiches liberalóides da direita tucana.
Mas o país não teria crescido sob Lula se não fosse a reorganização da economia, que, aliás, tornou possível a elevação de salários e a melhor distribuição da renda do trabalho, o que ocorreu sob Lula. As tão malditas reformas colocaram azeite na máquina econômica, aí incluída a privatização, goste-se ou não do modo como foram feitas.
Lula herdou os benefícios de tais medidas; por seu lado, pouco fez em matéria de reformas institucionais. Teve a "sorte" de um ambiente externo que favoreceu o crescimento brasileiro e permitiu os aumentos de gastos públicos. Mas, em parte, fez bom uso dessa "sorte", ao contrário do que dizem tucanos. O caso de Lula, porém, fica para outro dia.

vinit@uol.com.br


Texto Anterior: Internet: Banda larga tem expansão de 42% no semestre, diz estudo
Próximo Texto: Brasil é 2º mercado para a Monsanto
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.