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Zona cinzenta pode ter estimulado fraude
Para especialista, falta de controle no setor de cartões de crédito é convite a manipulações; PanAmericano nega desvio
Saldos teriam sido
adulterados, e cartões
de crédito que não
existem podem ter
sido contabilizados
MARIO CESAR CARVALHO
DE SÃO PAULO
Auditores do Banco Central que analisaram a documentação do Banco PanAmericano dizem ter encontrado os primeiros indícios
de desvio de dinheiro por
parte de executivos na operadora de cartão de crédito.
O PanAmericano, do Grupo Silvio Santos, tem um
rombo de R$ 2,5 bilhões, dos
quais R$ 400 milhões são da
empresa de cartão de crédito,
segundo o Banco Central.
As primeiras análises dos
técnicos apontam que metade dos R$ 400 milhões teria
sido desviada por executivos
que faziam parte da cúpula
do PanAmericano, segundo
a Folha apurou.
O número é apenas uma
estimativa preliminar, já que
esse tipo de apuração costuma levar meses.
CRÉDITO INVENTADO
Os técnicos do Banco Central descobriram dois tipos
de artifício nos quais os executivos usavam os cartões de
crédito de clientes para desviar dinheiro do banco: 1) a
manipulação dos saldos; 2)
criação de cartões fantasma,
sem que exista cliente.
O primeiro tipo era a manipulação mais comum. Imagine um cliente do cartão
PanAmericano que gastou
R$ 1.000 num mês, paga
R$ 200 e decide financiar o
saldo em prestações, o chamado "crédito rotativo".
Em vez de registrar um saldo de R$ 800, os executivos
dobravam esse valor, num
exemplo fictício. Numa operação com o banco PanAmericano, retiravam R$ 1.600,
em vez dos R$ 800. Pagavam
os R$ 1.000 aos lojistas com
os quais o cliente do cartão fizera compras e desviavam os
R$ 600 que sobravam.
O PanAmericano nega que
tenha havido desvios. Diz
que "as inconsistências contábeis estão sendo alvo de
apuração por parte das autoridades competentes e os valores necessários a sua regularização foram aportados
pelo controlador".
São fraudes grosseiras, segundo um técnico que acompanhou as negociações que
resultaram no empréstimo
de R$ 2,5 bilhões para salvar
o PanAmericano.
Na visão dele, o caso parece o do Banco Nacional, que
quebrou em 1995 -os desvios eram feitos a partir de
créditos inventados.
SEM CONTROLE
O desvio a partir dos cartões de crédito tem uma razão clara, segundo o advogado Jairo Saddi, professor do
Insper e um dos maiores especialistas em legislação
bancária do país: o BC controla a contabilidade dos
bancos, mas não faz esse tipo
de fiscalização nas empresas
de cartão de crédito. Segundo a lei brasileira, cartão de
crédito é uma operação mercantil, não financeira.
"As fraudes sempre ocorrem nas áreas em que há falta
de controle", afirma.
No Brasil, as empresas de
cartão de crédito são consideradas instituições financeiras para questões de sigilo
bancário, mas não o são para
o setor de fiscalização do BC.
Nos Estados Unidos e na
União Europeia, a legislação
é diferente -bancos e empresas de cartão são fiscalizados
pelos bancos centrais, segundo Saddi.
A falta de fiscalização nas
empresas de cartão de crédito funciona como um estímulo à fraude, para o advogado.
"Empresa de cartão de crédito precisa ser equiparada
às instituições financeiras e
fiscalizada pelo Banco Central", defende Saddi.
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