São Paulo, domingo, 19 de setembro de 2010

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Orçamento de calçado pirata sai em 3 dias

Reportagem da Folha faz visita a fábrica chinesa que promete produzir por R$ 4 Melissa que é vendida no Brasil por R$ 70

É tão grande a demanda na cidade chinesa campeã da pirataria de calçados que há falta de trabalhadores

Fabiano Maisonnave/Folhapress
Região de cidade de Quanzhou, em Fujian (China), que tem dezenas de fábricas de calçados

DO ENVIADO A PUTIAN

De sombrinha contra o sol quente, a empresária Zhong me espera na estação de trem de Putian, provavelmente o maior centro produtor mundial de calçados piratas.
Pauta do encontro, marcado por meio de anúncio na internet: comprar 6.000 pares de Melissas falsas.
Entramos num carro de placas pretas, indicando que pertence a um estrangeiro -a empresa tem sede nos EUA. Vamos a um escritório em um prédio residencial de classe média baixa. Ali, dois técnicos nos esperam.
Tiro da mochila três pares da Melissa original, dois modelos baixos e um de salto alto. Explico que quero o mais parecido possível, inclusive o cheiro doce do plástico.
"Nós já fabricamos esses dois", diz um deles. "Mas será preciso fazer um molde para o de salto alto, e isso custa 5.000 yuans [R$1.272]." Eles prometem um orçamento inicial em até três dias.
A reunião termina. Zhong, com simpatia de vendedora, convida a jantar e a conhecer o comércio de sapatos falsos.
Vamos a um restaurante. Em meio a oito pratos diferentes, conta que Putian, de quase 3 milhões de pessoas, virou uma grande fábrica de sapatos depois que uma unidade da Nike (original) se instalou, há duas décadas.
Rapidamente, conta, os tênis Nike passaram ser produzidos a partir de desenhos originais roubados. "Houve uma época em que havia uma fábrica no fundo de todas as casas aqui." Hoje, a produção está mais espalhada e há fábricas de grande porte -a que ela representa tem mil funcionários.
A demanda é tão grande que faltam trabalhadores. O salário saltou de R$ 356, no ano passado, para R$ 460, por uma jornada de dez horas, com quatro folgas mensais e duas refeições diárias, sem férias.
Depois vamos para a rua dos Estudantes. São dezenas de lojas de fábricas. O local só abre à noite, em razão do horário na Europa e nos EUA, origem da demanda.
Os clientes são pequenos revendedores de sapatos falsos. Eles recebem o pedido via internet e, após o pagamento on-line, vão às lojas comprar, geralmente um par. No dia seguinte, despacham.
Geralmente, a venda é feita por famílias, que faturam em média R$ 1.300 mensais.
Zhong conta que a produção e a comercialização são feitas sem maiores problemas, mas que é preciso subornar policiais.
Após três dias, chega o orçamento. O par da sandália sai por R$ 3,8, incluindo uma caixa igual à original (no site da Melissa, custa R$ 69,90). Capacidade de produção: 2.000 pares/dia. Com o cheiro, o pedido mínimo é de 100 mil unidades. Hora de cancelar o negócio. (FM)


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