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Islamitas velam corpos após massacre

Número oficial de vítimas no Egito chega a 638; parentes usam perfumes para disfarçar cheiro de cadáveres

Apoiadores de Mursi prometem hoje grandes atos contra o governo, no que chamam de 'Sexta-Feira da Raiva'

DIOGO BERCITO ENVIADO ESPECIAL AO CAIRO

Um dia depois do massacre de apoiadores islamitas do presidente deposto Mohammed Mursi, o dia ontem no Egito foi de velar os corpos das vítimas -- que, segundo o governo, chegaram a 638.

Dezenas de cadáveres eram levados para a mesquita de Imam, no Cairo, onde familiares lamentavam as perdas e legistas identificavam os mortos, que chegavam em fluxo ininterrupto.

As vítimas eram mantidas enroladas em panos manchados de sangue e resfriadas com blocos de gelo. O cheiro da putrefação se misturava, no ar pesado, com perfumes usados para disfarçar o odor.

Islamitas mostravam à Folha os corpos de seus familiares, afastando os tecidos para desvelar os rostos pálidos. Um deles caminhava com um saco plástico com pés humanos, restos de corpos destroçados.

Abdallah Muhsein, 21, chorava a morte do pai, ocorrida durante o desmonte. pelas forças de segurança. do acampamento ao redor da mesquita de Rabia al-Adawiya.

"Nós estávamos nas ruas pela legitimidade", afirmou. "Meu pai levou um tiro no ombro e outro nas costas."

O massacre teve início após a intervenção das forças de segurança nos dois acampamentos montados por islamitas para pressionar o governo depois do golpe militar que afastou Mursi do poder, no dia 3 de julho.

A deposição ocorreu após milhões de pessoas terem ido às ruas contra o governo, abalado pelo desempenho econômico ruim e por medidas consideradas excessivamente islâmicas por opositores.

Membros da Irmandade Muçulmana e simpatizantes da organização, da qual Mursi faz parte, diziam à reportagem que iriam permanecer nas ruas até retomar o poder --hoje temporariamente nas mãos de Adly Mansur. Para hoje, convocaram vários protestos, no que chamaram de "Sexta-Feira da Raiva".

Ontem, foram registrados ataques a escritórios do governo e a igrejas, e o Ministério do Interior instruiu a polícia a usar munição letal para proteger prédios públicos.

O governo acusou ainda a Irmandade de ter um plano "criminoso" para desestabilizar o Estado. Enquanto isso, autoridades judiciais anunciavam a extensão por 30 dias da detenção de Mursi. A medida foi tomada um dia após ter sido decretado estado de emergência e toque de recolher a partir das 21h.

"Vamos protestar todos os dias", afirmou o professor de inglês Muhammad Gamal, 31. "Toda gota de sangue derramada faz com que mais pessoas venham à rua."

Ontem, as ruas do Cairo estavam excepcionalmente vazias, com negócios fechados. Mas, com a abertura de vias bloqueadas por semanas por islamitas, a cidade tentava voltar ao ritmo habitual.

A região da mesquita de Rabia al-Adawiya, principal ponto onde os islamitas vinham se aquartelando, estava isolada por soldados.

Para os familiares de vítimas na mesquita de Imam, restava o desafio de identificar os corpos e, então, conseguir o certificado de óbito.

Alguns diziam ter sido recusados em hospitais. Outros, que receberam atestados de suicídio das vítimas.

O legista Mustafa Abd al-Ghani, 34, afirmou ter contado mais de 400 corpos na mesquita. Ele considerou baixa a estimativa de 638 mortos.

Ghani relatou, também, ter visto cadáveres com feridas no coração e na cabeça.

"Isso é criminoso", disse.


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