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Berço de rebelião síria faz 1 ano sitiado

No primeiro aniversário do início da revolta contra ditador Bashar Assad, Deraa permanece ocupada por militares

Opositores relatam que faltam eletricidade, água e diversos alimentos; toque de recolher começa às 19h

KAREN MARÓN
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, EM DERAA (SÍRIA)

"Se vocês não puderem gerar mais filhos, tragam suas mulheres para cá que nós o faremos", disse há um ano o chefe da segurança militar de Deraa a um grupo de pais de adolescentes detidas por fazer pichações contra o governo dizendo "o povo quer que o regime caia".

Após repressão cruel aos responsáveis pelo ato de protesto, a cidade no sudoeste da Síria, a 100 km de Damasco, pegou fogo. Nas semanas seguintes, a insurreição, que hoje faz seu primeiro aniversário, se alastrou pelo país.

O regime de Bashar Assad apostou na mão de ferro e já matou 8.000 pessoas, segundo a ONU. Se Homs é vista como o coração da rebelião, Deraa é o seu berço, e o bairro de Balad, seu núcleo.

No distrito histórico da cidade, Balad sofre o cerco permanente do Exército sírio. Desde os telhados e sacadas, soldados disparam contra quem tenta entrar ou sair.

Eletricidade, água e telefone foram cortados. O leite e os alimentos básicos já acabaram. Todo dia, durante a oração da tarde, milhares de vozes se elevam suplicando alimentos.

Em 29 de abril, pouco tempo após o início da rebelião, os vizinhos de povoados próximos tentaram romper o cerco militar, chegando às portas de Deraa com galões de água e ramos de oliveira para os soldados. De acordo com a organização Human Rights Watch, mais de 200 pessoas morreram nesse dia.

"Eu não vejo minha família há dois meses", comentou Mohammed, de 20 anos.

"Sei que minha mãe não tem como alimentar meus irmãos. Quero ajudá-los, mas vão me matar se eu chegar perto."

Mohammed foi ferido por um franco-atirador escondido. "Assad diz que somos mercenários islâmicos a serviço da Arábia Saudita e do Ocidente e que queremos assumir o controle da Síria", ele diz com fúria. "É mentira. Não são combatentes islâmicos nas ruas, somos nós."

CORPOS MUTILADOS

Deraa está rodeada por um cinturão de armas automáticas, mísseis terra-ar e tanques. Os soldados patrulham as ruas menores e se organizam em grupos de três. O toque de recolher começa às 19h e se estende por 12 horas.

As ruas estão bloqueadas por barreiras de sacos de areia atrás das quais ficam os soldados fortemente armados. Outros se instalam nos telhados das casas. As pessoas podem caminhar pelas calçadas, mas não nas ruas reservadas a veículos oficiais.

Hussein, 20, foi detido pela polícia militar e passou um mês preso no sótão da sede da polícia. Ele diz que seu interrogatório poderia ter sido pior. "Meu irmão de 18 anos foi preso em 22 de abril. Não sei se ele está vivo ou morto."

Nesta cidade, o estádio de futebol e as escolas foram convertidos em centros de detenção. A maioria das famílias tem ao menos um membro na prisão, morto ou desaparecido.

"Há um ano éramos pelo menos 15 mil manifestantes. Em sua maioria homens jovens, mas também pais com seus filhos. Os soldados começaram a atirar", diz Ali, lembrando o momento em que tudo começou.

Em Deraa, conta-se que, visando semear o medo, o regime devolve corpos destroçados às famílias. Alguns homens sofrem mutilações dos genitais -uma humilhação final antes da morte.

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