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40 anos depois

Watergate

Caso que derrubou o presidente dos EUA transformou "-gate" em sufixo para outros escândalos

CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA
ESPECIAL PARA A FOLHA

Watergate é um exemplo que se pode contrapor à "teoria do grande homem", formulada no século 19 pelo historiador escocês Arnold Toynbee ("a história do mundo não é nada mais do que a biografia de grandes homens").

Muita gente, mesmo sem conhecer especificamente essa formulação, tende a atribuir à ação de indivíduos especiais a responsabilidade pelos fatos extraordinários, que mexem no curso normal dos acontecimentos.

Os "heróis" de Watergate foram pessoas comuns, que não fizeram nada de particularmente relevante nem antes nem após sua participação no processo que levou à descoberta de falcatruas no governo de Richard Nixon e às posteriores renúncia do presidente dos EUA e condenações de diversas autoridades do primeiro escalão do governo federal.

Dois repórteres quase anônimos de menos de 30 anos de idade, dois congressistas cujos nomes eram ignorados pela maioria absoluta dos eleitores do país, um inexpressivo juiz de uma corte federal em Washington, um professor de direito de mínimo reconhecimento público foram os personagens principais do drama político que por dois anos ganhou a atenção do mundo e deixou repercussões até hoje.

O que fez de Watergate um marco histórico foram instituições coletivas que funcionaram bem. O que Woodward, Bernstein e outros fizeram de virtuoso foi terem agido rigidamente de acordo com os preceitos dessas instituições (a imprensa, o Legislativo, o Judiciário) e terem colocado à margem suas próprias preferências ideológicas e partidárias ou suas conveniências e gostos pessoais.

O "grande homem" do episódio (que assim se considerava e continua sendo por muitos), Richard Nixon, foi quem deflagrou a tragédia e definiu sua própria derrocada, por ter se considerado acima das instituições.

Paranoico, prepotente, sectário, praticou e estimulou entre seus aliados abusos e ilegalidades, como se eles estivessem acima do que se aplicava aos mortais devido à grandiosidade das missões de que estavam imbuídos.

Mas o perdão irrestrito concedido a Nixon por seu sucessor, Gerald Ford, e o abandono a que foram relegadas as alterações nas leis eleitorais aprovadas após Watergate para limitar a influência do dinheiro nas campanhas são testemunhos de que a prevalência das instituições tem seus limites.

CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA é editor da revista "Política Externa" e autor de "Correspondente Internacional"

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