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Análise

Cruz Vermelha falar em 'guerra civil' não aumenta a proteção na Síria

O PRIMEIRO EFEITO DE CLASSIFICAR UMA SITUAÇÃO DE VIOLÊNCIA COMO "GUERRA" É A SUPRESSÃO DOS DIREITOS DAS PESSOAS

JOÃO PAULO CHARLEAUX
ESPECIAL PARA A FOLHA

Dizer que a Síria está em "guerra civil" não aumenta a proteção de ninguém. Também não torna mais fácil enviar criminosos para tribunais internacionais.

O primeiro efeito de classificar uma situação de violência como "guerra" é a supressão dos direitos das pessoas. O segundo é a ampliação do direito do Estado.

As Forças Armadas poderão recorrer a meios e métodos de combate ainda mais destrutivos para vencer seus inimigos. E os rebeldes também. Afinal, estão em "guerra" agora, sem pudores.

A declaração de que a Síria entrou em guerra civil é uma constatação de que os rebeldes sírios têm "um comando responsável e exercem sobre uma parte do território um controle tal que lhes permite realizar operações militares contínuas e concentradas". É o que diz o Protocolo Adicional 2 às Convenções de Genebra de 1949.

Se, antes, os rebeldes eram apenas civis portando armas, como numa situação de violência urbana semelhante, por exemplo, ao Rio ou a Ciudad Juarez, no México, a partir de agora, eles passam a ser considerados "combatentes".

Portanto, passam a ser também alvos legítimos de ataques deliberados das Forças Armadas regulares.

As mortes dessas pessoas serão, assim, legais -desde que não sejam produtos de execuções sumárias, sob tortura, acobertadas por desaparecimentos forçados ou outro crime previsto no Protocolo.

Quanto aos civis, a obrigação de respeito a essa categoria de pessoas é permanente. Ela já existia antes. E já vinha sendo violada. Pessoas que não participam das hostilidades são protegidas durante todo o tempo, seja guerra ou não guerra.

Entretanto, quando há uma "guerra civil", vários direitos dos civis podem ser suprimidos sob alegação de "segurança nacional", por exemplo a liberdade de expressão, associação e manifestação.

O que o Comitê Internacional da Cruz Vermelha fez foi determinar o marco jurídico dentro do qual suas operações serão realizadas. Isso tem impacto sobre a prerrogativa de visitar pessoas detidas e entregar ajuda humanitária.

A organização não tem por função classificar juridicamente as situações, embora, do ponto de vista prático, o efeito seja esse.

JOÃO PAULO CHARLEAUX é jornalista especializado em direito internacional humanitário

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