São Paulo, sexta, 1 de maio de 1998 |
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TIMOR LESTE Em entrevista à Folha, o prêmio Nobel José Ramos-Horta diz que Indonésia deixou de ser tigre e virou "gato pobre' Crise indonésia leva separatistas a aliança
OTÁVIO DIAS José Ramos-Horta - Decidimos fundar o Conselho Nacional de Resistência Timorense, que vai coordenar todas as ações. Os 21 membros foram eleitos e são pessoas de grupos diversos, com diferentes opiniões sobre qual seria a melhor estratégia de resistência, além de diferenças ideológicas. Mas todos têm algo em comum: o desejo de autodeterminação. É uma manifestação inequívoca de unidade nacional e de coesão. Folha - Quais são os principais grupos que formam o conselho? Ramos-Horta - A Fretilin (Frente Revolucionária do Timor Leste Independente), com uma ideologia mais de esquerda, e a União Democrática Timorense, mais conservadora. Há também o Conselho Nacional de Resistência Maubere e a guerrilha Falintil (Forças Armadas de Libertação Nacional de Timor Leste). E diversas associações de jovens, estudantes, ex-presos políticos, intelectuais etc. Dos 21 membros do conselho, um terço está no exterior, e dois terços, em Timor Leste. Folha - O sr. recebeu o Nobel da Paz em 96, juntamente com o bispo Carlos Filipe Ximenes Belo, administrador apostólico de Dili, capital de Timor Leste, porque ambos sempre buscaram uma solução pacífica. O fato de o conselho incluir representantes da guerrilha não vai contra essa idéia? Ramos-Horta - Mantenho minha convicção de que o melhor é a solução pacífica por meio do diálogo. Mas reconheço o direito dos oprimidos de se defender com uma arma nas mãos. Em 23 anos de resistência, a guerrilha de Timor Leste nunca atacou civis, seja em Timor ou na Indonésia. Os alvos sempre foram militares. Folha - Mas a inclusão da guerrilha não pode dificultar o diálogo? Ramos-Horta - A guerrilha já se declarou disposta a aceitar um cessar-fogo se a Indonésia parar com a repressão e começar a conversar. A comunidade internacional não tem autoridade moral para exigir que a resistência suspenda unilateralmente a luta armada, pois vende armas para o Exército da Indonésia. Além disso, a inclusão da guerrilha é positiva porque, quando chegar o momento de suspender a luta armada, será mais fácil transmitir ao grupo nossa decisão. Folha - Por que só agora, 22 anos depois da anexação, os diferentes grupos de resistência se uniram? Ramos-Horta - Fala-se muito na divisão dos grupos pró-independência, mas, se nós fôssemos tão divididos, não teríamos resistido tanto tempo. Somos um país pequeno, com cerca de 800 mil habitantes. A Indonésia tem 200 milhões de habitantes e um Exército de 400 mil homens. Antes estávamos desorganizados, mas agora, apesar de algumas divergências, todos temos uma única causa: a conquista da autodeterminação. Folha - Quais serão os primeiros passos do novo conselho? Ramos-Horta - Do ponto de vista externo, vamos continuar mobilizando a opinião pública internacional e a própria sociedade indonésia. Mas a verdadeira resistência -política, cultural, religiosa e mesmo armada- está em Timor. Por isso, dois terços dos membros do conselho estão lá. Folha - Em sua opinião, quais são as chances de se conseguir a independência de Timor Leste? Ramos-Horta - A conjuntura é favorável. O regime militar da Indonésia está ameaçado pela crise econômica e financeira da Ásia. No plano doméstico, os estudantes e outros setores estão protestando. Do ponto de vista internacional, o país está mais vulnerável às pressões. A Indonésia deixou de ser um tigre da Ásia. Virou um gato pobre. Próximo Texto | Índice |
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