São Paulo, quarta-feira, 01 de junho de 2005

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EUROPA

Batido no plebiscito sobre a Carta da UE, presidente francês põe Villepin no governo e dá cargo a rival conservador

Chirac troca premiê e fala em "incertezas"

MÁRCIO SENNE DE MORAES
ENVIADO ESPECIAL A PARIS

O presidente da França, Jacques Chirac, escolheu ontem o ministro do Interior, Dominique de Villepin, 51, para substituir Jean-Pierre Raffarin no posto de premiê, conforme era esperado desde antes da derrota do "sim" no plebiscito sobre a Constituição européia, no domingo.
"O plebiscito abriu um período de dificuldades e incertezas para a Europa e para a França. Devemos marchar juntos em defesa dos interesses nacionais", disse Chirac, ontem à noite, em cadeia de TV.
O presidente não admitiu que o plebiscito seja um "não" definitivo da França à Europa. Interpretou o resultado das urnas como uma demanda dos franceses por "ações determinadas e imediatas" em favor de problemas internos, como o desemprego e a estagnação dos salários.
O nome de Villepin não era, contudo, bem-visto pelos deputados da União por um Movimento Popular (UMP), o partido de Chirac, que preferiam a escolha do presidente da legenda, Nicolas Sarkozy. Este é o maior rival de Chirac na direita francesa.
Para acalmar os ânimos, Sarkozy voltará ao posto de ministro do Interior (número 2 do governo), que ocupou antes de Villepin. Porém a "coabitação" entre ambos deverá ser espinhosa, segundo analistas. Afinal, na semana passada, Sarkozy disse que alguém que nunca ganhou uma eleição decidida pelo sufrágio universal (Villepin) "não poderia ser premiê".
A oposição não demorou para criticar a nomeação de Villepin e a agora certa presença de Sarkozy em seu gabinete. Para os socialistas, Chirac "não ouviu a mensagem das urnas" no domingo, quando "os franceses se pronunciaram claramente contra as políticas do governo ao rejeitar a Constituição européia".
Para vários oposicionistas, como a ex-ministra da Justiça Elisabeth Guigou (socialista), a França atravessa uma "real crise de regime, além de um caos político".

Raffarin
O agora ex-premiê Raffarin nunca foi um protagonista da cena política francesa. Ex-presidente do Conselho Regional de Poitou-Charentes (oeste), sempre foi visto como um homem do interior -da "França profunda"- e foi apelidado de "camponês do Poitou" por jornais e por programas de TV satíricos.
Seu balanço no governo é catastrófico, tendo terminado como o premiê mais impopular (74%) da história da Quinta República, começada em 1958. Seus problemas começaram em 2003, quando lançou seu projeto de reforma da aposentadoria. Em seguida, num verão particularmente quente, uma onda de calor matou milhares de pessoas, e ele foi acusado de demorar demais para reagir porque estava de férias.
Na volta às aulas, em setembro do mesmo ano, greves de estudantes e de professores abalaram ainda mais sua posição. Porém 2004 seria ainda pior. O aprofundamento de seu projeto de reformas, que atingiu a educação, a Previdência Social e o mercado de trabalho, foi muito malvisto, e a UMP sofreu duas graves derrotas nas eleições regional e européia, ainda no primeiro semestre.
Contra todas as expectativas, Chirac o manteve no poder. Com isso, Raffarin acabou sendo um dos principais cabos eleitorais do "sim" na campanha para o plebiscito sobre a Carta européia. Após a clara derrota de domingo, cujo maior responsável foi, sem dúvida, Chirac, sua permanência no poder tornou-se impossível. Ele foi premiê durante 37 meses.


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