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Nigéria processa Pfizer por teste fatal de remédio
Experimento teria matado ao menos 11 crianças; farmacêutica nega ter errado
Caso de 1996 inspirou o livro "O Jardineiro Fiel", de John Le Carré; processo é o primeiro no continente contra grande farmacêutica
ANDREW GUMBEL
DO "INDEPENDENT", EM LOS ANGELES
Foi aberto na Nigéria um
processo criminal contra a gigante farmacêutica americana
Pfizer, por um teste clínico que
a empresa fez há dez anos com
crianças durante uma epidemia de meningite. Os pacientes
se tornaram cobaias involuntárias de um antibiótico novo,
que ainda não tinha sido testado, e muitos deles morreram ou
sofreram danos permanentes.
A Pfizer e seus representantes serão responsabilizados
num julgamento que começará
em junho na Nigéria, onde a população local não confia mais
no governo para imunizar seus
filhos contra a poliomielite.
O episódio, que já motivou
uma ação judicial em tribunais
americanos, sem sucesso, inspirou o romance "O Jardineiro
Fiel", de John Le Carré.
As autoridades nigerianas dizem que, em 1996, pesquisadores da Pfizer selecionaram 200
crianças e bebês vítimas da epidemia no Estado de Kano e deram a cerca de metade delas um
antibiótico não testado chamado Trovan. A ação judicial alega
que os pesquisadores não pediram o consentimento das famílias, apesar de saberem que o
Trovan poderia ter efeitos colaterais e pôr a vida dos pacientes
em risco.
A ação afirma, também, que
os pesquisadores deram à outra
metade dos pacientes uma droga de comparação produzida
pela Hoffman-La Roche, concorrente da Pfizer, mas propositalmente deram doses abaixo
das necessárias para fazer seu
próprio produto ter resultados
melhores. Concluído o teste, a
Pfizer deixou a região e "apagou quaisquer evidências" dele.
Um relatório do governo nigeriano constatou anteriormente que a Pfizer em nenhum
momento informou às crianças
ou a seus pais que eles estavam
participando de um teste, nem
os informou da existência de
tratamentos alternativos.
Esse relatório constatou que,
das 11 crianças que morreram,
cinco tinham tomado Trovan e
seis tomaram doses baixas do
medicamento de comparação,
Ceftriaxone. Um número desconhecido de crianças desenvolveu surdez, cegueira, paralisia e outros tipos de invalidez.
As autoridades de Kano acusaram a Pfizer por oito instâncias de conspiração criminosa e
por voluntariamente causar
danos graves. Elas também
abriram uma ação cível pedindo mais de US$ 2,7 bilhões em
indenização por danos. A Pfizer
reagiu insistindo que não cometeu erro nenhum (leia texto
da empresa nesta página).
Em 1997, quando a Pfizer enfrentou uma auditoria do governo americano, a empresa
exibiu uma carta de um hospital de Kano dizendo que seu estudo tinha sido aprovado pelo
comitê de ética do hospital. Os
acusadores da empresa alegam
que a carta foi forjada.
A decisão da Nigéria é o primeiro caso conhecido de um
país do Terceiro Mundo a processar uma multinacional farmacêutica.
O Trovan nunca chegou a ser
aprovado para uso em crianças
nos EUA. Em 1997 seu uso foi
autorizado em adultos, mas foi
restringido mais tarde. A substância é proibida na Europa.
Tradução de CLARA ALLAIN
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