São Paulo, sábado, 01 de julho de 2006

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Oposição argentina usa onda de crimes contra Kirchner

Atos brutais fazem país lembrar violência de 2003; governo vê motivação política

Informe oficial aponta alta "exponencial" este ano de seqüestros relâmpagos e toca numa das bandeiras da oposição a Néstor Kirchner

FLÁVIA MARREIRO
DE BUENOS AIRES

Acusado de roubar uma TV, Lucas Ivarrola, 15, foi seqüestrado por três homens na segunda-feira em Buenos Aires, levou um tiro e, quando agonizava, foi queimado vivo. No mesmo dia, outros três homens atacaram um motorista de ônibus, o roubaram e lhe cortaram três dedos.
Os crimes brutais e o aumento dos seqüestros relâmpagos -apontado num relatório oficial- e o crescimento do roubos de carros (11% neste ano, segundo as seguradoras) deu fôlego à polêmica entre o governo Kirchner, integrantes da Justiça e a imprensa: há uma nova onda de insegurança no país, como a que ocorreu em 2003?
Naquele ano, houve 508 seqüestros e passeatas com milhares de pessoas pedindo o endurecimento das leis penais do país. Agora, de abril do ano passado até abril de 2006, foram 44 crimes do tipo, a maioria seqüestros relâmpagos.
Apesar da queda, o informe da unidade de seqüestros da Procuradoria Geral da Nação aponta o "exponencial crescimento que sofreu o tipo de delito na Capital em 2006".
O documento, publicado pelo jornal "La Nación", é um dos poucos termômetros dos casos violentos, que mereceram nos últimos dias as manchetes do diário conservador, que o governo Kirchner classifica como "opositor".
Ao contrário do Brasil, na Argentina o governo não divulga dados periódicos sobre a violência -a tese é que as estatísticas ajudam a popularizar os "crimes do momento"- e acusa a imprensa de tentar o implantar o clima de insegurança. Nos bastidores, fala-se de motivos eleitorais para a movimentação.
Aumentar a segurança é uma das bandeiras de um opositor de Kirchner, o deputado Mauricio Macri, que já declarou que será candidato a presidente. Kirchner já se lançou na campanha do ano que vem: tanto para a Casa Rosada como nas disputas provinciais. Anteontem, ministros do governo lançaram em Buenos Aires o "Compromisso K", a corrente que concorrerá apelando para a popularidade de Kirchner.

Comoção
O pai de Lucas, o adolescente queimado vivo, foi recebido pelo presidente Néstor Kirchner. O governo preferiu relacionar o crime com ecos da "repressão militar" -uma bandeira estratégica do governo, já que dois dos detidos são suboficiais da Marinha argentina e a secretaria de Direitos Humanos foi acionada.
O comentarista do "La Nación" Fernando Rodríguez respondeu dizendo que a Casa Rosada trata o problema da segurança com "oportunismo político e inclinações ideológicas".
O crime causou comoção: a casa do pai dos acusados foi queimada pela população de Luján, onde ocorreu o crime, na Grande Buenos Aires. É que, antes da autópsia, se divulgou que o adolescente havia tido as mãos e o orelha arrancadas pelos assassinos -o cadáver foi mutilado por animais depois, segundo informações extra-oficiais dos legistas.
A juíza do caso, que cobrou políticas para proteger os menores de idade da violência, foi acusada pelo ministro do Interior, Aníbal Fernández, de querer "15 minutos de fama". "A valorização do nível de delito na Argentina se parece mais com a Europa do que com a América. Não concordo chamar de [onda] de insegurança."
"Não jogo com estatísticas para não faltar o respeito com a família das vítimas, mas sei bem o que está acontecendo", completou Fernández. Segundo ele, que é o chefe da Polícia Federal argentina, há 5,87 homicídios por cada 100 mil habitantes/ano.


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