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Indonésia tenta mudar imagem de abrigo de radicais
País de maior população islâmica no mundo aproveita reunião ambiental para mostrar ao mundo a "terceira via" religiosa
Atentados recentes e ritmo do desmatamento florestal prejudicam ação do governo para eliminar preconceito que atinge o arquipélago
SÉRGIO DÁVILA
ENVIADO ESPECIAL À INDONÉSIA
Nas últimas semanas, adversários do senador americano
Barack Obama, pré-candidato à
sucessão de George W. Bush e
um dos quatro mais bem colocados na corrida presidencial,
iniciaram uma campanha de
difamação. Eles dizem que o
democrata seria uma "criação
muçulmana", plantada por radicais islâmicos para tomar a
Casa Branca.
Eleito, afirmam, fará o juramento inaugural usando um
Corão, o livro sagrado muçulmano, e não uma Bíblia. A prova? A "madrassa" -escola islâmica- em que Obama estudou
quando criança em Jacarta, na
Indonésia.
Há diversas mentiras na história. Lolo Soetoro, o padrasto
de Obama, era mesmo muçulmano da Indonésia, e o senador
chegou a ir a mesquitas no arquipélago asiático, onde passou
parte da infância, nos anos 60.
Mas ele foi criado por uma mãe
do Kansas religiosamente relapsa, num lar secular. Hoje, o
político segue a igreja evangélica Unida de Cristo.
Bastava uma visita ao local
em questão, a escola de primeiro grau Menteng, para derrubar o mito. Situada em Besuki,
bairro de classe média de Jacarta, a escola é freqüentada
por filhos da elite local e de executivos e diplomatas estrangeiros. Há de católicos a budistas,
e o time de basquete é apoiado
por garotas de minissaia.
Islã do futuro
O preconceito maior, no entanto, é com o país. Por ter a
maior população de muçulmanos do mundo -86% dos 234
milhões de habitantes-, a Indonésia luta para mudar sua
imagem de celeiro de terroristas islâmicos. Para tanto, o governo de Susilo Bambang Yudhoyono, no poder desde 2004,
montou uma estratégia com
dois pilares.
O primeiro é aproveitar o saldo de boa vontade mundial
com que o país ainda conta desde o tsunami de 2004, que atingiu principalmente essa região,
deixando 250 mil vítimas e US$
3 bilhões em prejuízo. O segundo é usar a vitrine que virará
sua principal locação turística,
a ilha de Bali, ao sediar a Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas, que começa na
segunda-feira, para vender o
que está sendo chamado internamente de "o islã do futuro".
Para tanto, times de diferentes áreas governamentais foram mobilizados para mostrar
ao mundo o que Eddi Hariyadhi define à Folha como "a terceira via religiosa". Para o embaixador da Indonésia para a
Europa e as Américas, o país
inova por não ter nem o peso
do Estado islâmico de lugares
como o Irã nem o autoritarismo da maioria dos governos de
países árabes.
A reportagem visitou tanto o
maior templo budista do Sudeste Asiático, Borobudur, na
Província de Yokyakarta, no
centro-sul, quanto o chinês
Sam Po Kong, em Semarang,
na costa norte. Ambos ficam na
ilha de Java, a de maior densidade populacional do arquipélago. No segundo, encontrou o
octogenário Prawira Wijaya,
que disse freqüentar o local todos os dias, sem problemas.
A sensação é amparada por
números. Levantamento do
Instituto de Pesquisa Indonésio do mês passado conclui que
a maioria quer um governo secular. Dos ouvidos, 57% discordam do uso dos valores islâmicos na política, ante 33% a favor. Aumentou a porcentagem
dos que apóiam candidatas
mulheres à Presidência (41%,
ante 30% em 2006), e o número dos que apóiam organizações islâmicas políticas continua residual (13%).
"Isso mostra que tais grupos
atraem uma parcela ainda pequena da população", disse Saiful Mujani, diretor do instituto.
"Mostra ainda que, uma vez
envolvidos em política, eles
têm de secularizar-se para conseguir votos, o que elimina seus
elementos mais radicais."
O problema é que a estratégia oficial apresenta falhas nos
dois pilares. Embora a tolerância religiosa indonésia tenha sido elogiada já nos anos 50 por
gente insuspeita como o recém-falecido antropólogo Clifford Geertz (1926-2006), de
Princeton, grupos radicais começam a surgir e a agir.
O principal é o Jemaah Islamiyah, apontado como responsável pelo ataque terrorista de
Bali em 2002, que matou 202
pessoas. É acusado também
pelos ataques ao hotel Marriott
no ano seguinte, em Jacarta,
com 12 mortos; à embaixada
australiana em 2004, também
na capital, com oito vítimas; e
ao segundo ataque a Bali, em
2005, com 20 mortos. São exceções; foram presos e isolados, responde o chefe nacional
de polícia, general Sutanto.
Ambiente
A outra questão é ecológica.
O país foi bastante criticado no
último relatório anual de desenvolvimento humano da
ONU na questão dos biocombustíveis. Aqui, a matéria-prima é o óleo de palmeira, o que
estaria devastando o pouco que
resta da floresta original. Junto
da Malásia, o país é responsável
por 90% da produção mundial
desse biocombustível. E é também o terceiro maior emissor
global de gás carbônico, atrás
apenas dos EUA e da China.
"Desmatar para dar lugar à
monocultura em larga escala de
grãos energéticos ofusca as credenciais verdes dos biocombustíveis", diz o texto, após referir-se à Indonésia.
O problema é econômico, diz
Hadi Soesastro, diretor-fundador do Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais.
"Sem biocombustível, faltam
empregos."
O jornalista SÉRGIO DÁVILA viajou a convite da
Chancelaria da Indonésia
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