São Paulo, sábado, 02 de abril de 2005

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A AGONIA DO PAPA

O cardeal Francesco Mario Pompedda, um dos poucos que tiveram acesso ao papa ontem, relatou seu encontro com o pontífice

"Seu olhar sereno se comunicava comigo"

DO "LA REPUBBLICA"

O cardeal Francesco Mario Pompedda, presidente da Segnatura Apostolica (supremo tribunal do Vaticano), é uma das pouquíssimas pessoas que foram admitidas aos aposentos do papa na manhã de ontem. Ele conta as impressões que lhe causou o pontífice, deitado em seu amplo leito branco.
"Cheguei pouco depois do meio-dia e fui recebido pelo monsenhor Stanislao. Percorrendo o corredor que conduz ao quarto do santo padre, nos detivemos por um instante para rezar na capela", diz.
 

Pergunta - Cardeal Pompedda, quais são as impressões que lhe ficaram de sua última visita aos aposentos de João Paulo 2º?
D. Francesco
- A cama do papa estava quase no meio do quarto, uma cama larga com lençóis brancos. Era tudo branco. O papa estava deitado, apoiado em alguns travesseiros, meio curvado sobre o flanco direito.

Pergunta - E o que se passou?
D. Francesco
- O secretário me apresentou: "Santo padre, o cardeal Pompedda", e o papa se voltou e olhou em minha direção.

Pergunta - Como estava o papa?
D.Francesco
- Seus olhos estavam entrecerrados, mas não dormia. Quando meu nome foi dito, abriu completamente os olhos.

Pergunta - E o sr.?
D. Francesco
- Fiquei impressionado com a beleza daquele olhar sorridente. Ele desejava claramente que eu notasse que me reconhecia.

Pergunta - Como Vossa Eminência reagiu?
D. Francesco
- Ajoelhei-me ao lado da cama, apoiei meu braço no dele e lhe disse, vagarosamente, o quanto ele era me era caro.

Pergunta - O papa respondeu?
D. Francesco
- Percebi que queria me saudar e que se esforçava por dizer algumas palavras, mas não conseguiu falar.

Pergunta - Conseguiu se fazer entender de alguma maneira?
D.Francesco
- Seu olhar sorridente e sereno se comunicava comigo.

Pergunta - Realmente sereno?
D. Francesco
- Sim, não mostrava sinal algum de sofrimento. Ainda que sua respiração claramente indicasse desconforto, não era um resfolegar doentio.

Pergunta - O que o sr. fez, então?
D. Francesco
- Estava de joelhos e exprimi a ele o meu afeto filial. Queria que sentisse que eu estava com ele e que orava com ele. Fiquei daquele jeito por alguns minutos, meu braço pousado sobre o dele. Depois o monsenhor Dziwisz fez-me sinal de que era hora de levantar. Evidentemente, não queria que o papa se fatigasse.

Pergunta - O papa o saudou?
D. Francesco
- Fez um gesto como se quisesse falar, mas não conseguia, mas continuava a me encarar com aquele olhar franco e aberto.

Pergunta - O sr. refletiu sobre a possibilidade de que aquele talvez fosse seu último encontro íntimo com o pontífice?
D. Francesco
- Saí tomado de uma grande emoção. Vê-lo daquele jeito, deitado no leito de lençóis brancos, me impressionou. E aqueles olhos, que me acompanharam até que deixei o quarto!


Tradução de Paulo Migliacci

Copyright La Repubblica 2005


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