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"A corporatocracia está no poder"
MARCELO NINIO
DA REDAÇÃO
O livro de John Perkins, "Confissões de um assassino econômico" (Editora Cultrix), é um prato
cheio para os teóricos da conspiração. Em tom confessional, como indica o título, Perkins conta a
experiência que viveu na pele de
um "assassino econômico", profissional que manipula números e
chantageia governos ao redor do
mundo a serviço do que chama de
"corporatocracia" -conluio entre a Casa Branca e grandes empresas, com a ajuda do Banco
Mundial e do FMI, para assegurar
o poderio do império norte-americano. A seguir, trechos da entrevista de Perkins à Folha, concedida por telefone, da Flórida (EUA).
Folha - O que é a corporatocracia?
John Perkins - Desde a Segunda
Guerra Mundial, os assassinos
econômicos construíram o primeiro império verdadeiramente
global. Isso foi feito principalmente por meios econômicos,
não militares. No lugar de um rei,
esse império é controlado pelo
que chamo de corporatocracia,
um grupo de homens que administra grandes empresas. Através
dessas empresas controlam o governo dos EUA e muitos outros
no mundo. Não importa se o presidente [dos EUA] é republicano
ou democrata: é a corporatocracia
que está no poder.
Folha - Como esse poder é exercido?
Perkins - As pessoas que ocupam o topo do governo dos EUA
são egressas de corporações, até o
presidente. Os assassinos econômicos oferecem enormes empréstimos do Banco Mundial e de outras organizações a governos estrangeiros, que em seguida são
pagos a nossas próprias empresas, como a Halliburton, para
construir projetos de infra-estrutura. Depois, os assassinos econômicos voltam aos países e dizem
que, já que não têm dinheiro para
pagar suas dívidas, esses governos
terão que nos vender petróleo barato, votar conosco na ONU ou
enviar tropas para alguma missão
dos EUA no mundo.
Folha - Como o sr. entrou nisso?
Perkins - Fui recrutado quando
ainda estava na faculdade pela
Agência de Segurança Nacional,
que me submeteu a uma série de
testes e concluiu que eu daria um
ótimo assassino econômico. Fui
treinado por essa mulher notável
que descrevo em detalhes no livro, Claudine, que conhecia minhas fraquezas e era muito inteligente e sedutora. Ela me disse que
era um negócio sujo e que no momento em que eu entrasse eu não
poderia sair. Mas era jovem e pensei que poderia ser a exceção. Senti culpa nos dez anos em que fui
assassino econômico. Foi a culpa
que me fez deixar o trabalho.
Folha - Por que o sr. demorou 30
anos para contar essa história?
Perkins - Comecei algumas vezes a escrever este livro e toda vez
vinham me ameaçar e me subornar. Numa das vezes recebi US$
500 mil. Comecei a trabalhar com
populações nativas na Amazônia
e nos Andes e muito do dinheiro
que recebi como suborno foi usado para ajudar essas pessoas. Até
que aconteceu o 11 de Setembro, e
percebi que tinha que escrever o
livro. Os americanos não entendem porque tanta gente no mundo tem medo de nós e nos odeia.
Eu tinha que explicar. É importante tentar entender os sentimentos das pessoas no resto do
mundo. Isso não quer dizer que
eu tenha a pretensão de saber o
que se passa nas cabeças dos assassinos ou que eu esteja tentando
justificar assassinato em massa.
Folha - Em seu livro a Amazônia
ocupa lugar de destaque, como alvo da cobiça dos EUA.
Perkins - Não há dúvida de que
os EUA estão em processo de roubar a Amazônia. No Equador e na
Colômbia, países que conheço
bem, nossas empresas petrolíferas entram e trabalham com grupos missionários para mover populações nativas, instalar equipamentos de prospecção e construir
estradas e negociar com gente
corrupta do governo para destruir áreas enormes da Amazônia.
Folha - Porque esse sistema não
funcionou no Iraque?
Perkins - Tentamos convencer
Saddam Hussein a aceitar o mesmo acordo que conseguimos com
a Arábia Saudita nos anos 70 [para ter controle sobre seu petróleo]. Ele não aceitou. Mandamos
chacais para assassiná-lo, mas
eles não conseguiram, porque
Saddam tinha uma segurança
muito boa e muitos sósias. Como
os assassinos econômicos e os
chacais fracassaram, tivemos que
mandar o Exército [em 1991 e
2003]. Se Saddam tivesse aceitado
o mesmo tipo de acordo que fizemos com os sauditas, ele ainda estaria no poder.
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