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Bolívia toma controle de hidrocarbonetos
Morales anuncia que Estado passa a ser maior acionista de quatro empresas do setor, completando processo iniciado em 2006
Decisão engloba campos onde é produzido quase todo o gás exportado para o Brasil; empresa telefônica também é nacionalizada
FABIANO MAISONNAVE
ENVIADO ESPECIAL A SANTA CRUZ DE LA SIERRA
O governo Evo Morales
anunciou ontem a retomada do
controle acionário de quatro
empresas do setor de hidrocarbonetos, das quais duas são estratégicas para a exportação de
gás para o Brasil. O presidente
boliviano também decretou a
nacionalização da Entel, a
maior telefônica do país, pertencente à Telecom Itália.
Das cinco empresas, apenas a
Andina, controlada pela hispano-argentina Repsol-YPF, chegou a um acordo com o governo. As demais tiveram o decreto de nacionalização assinado
por Morales na praça Murillo,
centro da capital La Paz, diante
de uma pequena multidão que
celebrava o Dia do Trabalho.
"A partir de hoje, o Estado
tem 50% mais um das ações de
todas as nossas empresas chamadas capitalizadas do setor de
hidrocarbonetos", discursou
Morales, do alto de um palanque. "A partir deste momento, a
YPFB [estatal boliviana] se prepara não apenas para a administração e operação como
também para a exploração e
perfuração de novos campos
para a nossa querida Bolívia."
Pouco antes, uma cerimônia
no Palácio Quemado (sede do
governo) havia reunido Morales e representantes da Repsol.
Pelo acordo, a YPFB comprou
1,08% das ações, o suficiente
para chegar aos 51% do total. A
operação custou US$ 6 milhões, segundo o governo.
No ato, Morales elogiou o
"desprendimento" da Repsol.
"Ratificamos que queremos sócios e não donos de nossos recursos", disse.
Já o representante da Repsol
na Bolívia, Tomás García, disse
que a empresa entra numa "nova etapa, que pode ser um
exemplo de sinergia e trabalho
de equipe entre uma companhia estatal e uma privada".
Efeito para o Brasil
A Andina detém 50% dos
megacampos de San Antonio e
San Alberto, responsáveis pela
produção de quase todo o gás
enviado ao Brasil. Ambos são
operados pela Petrobras, que
possui 35% de cada um.
Já as empresas do setor de
hidrocarbonetos que não chegaram a um acordo com governo são a Chaco (British Petroleum, britânica), a Transredes
(Ashmore, britânica) e a CLHB
(Companhia Logística de Hidrocarbonetos Boliviana), de
capitais alemães e peruanos.
Dessas, a mais estratégica para o Brasil é a Transredes, que
controla 51% do lado boliviano
do gasoduto Brasil-Bolívia (557
km), administrado pela GTB
(Gás Transboliviano). A empresa é também sócia minoritária do lado brasileiro do gasoduto (cerca de 2.500 km), com
participação de 12%.
Anteontem à noite, a polícia
boliviana cercou a sede da
Transredes, em Santa Cruz.
Durante o dia de ontem, cinco
policiais permaneciam na entrada da empresa com ordens
para revisar veículos e impedir
a saída de documentos.
Procurada pela Folha, a
Transredes informou que ainda estava analisando o decreto
de nacionalização e que as operações da empresa não sofreram alterações ontem.
O controle acionário das
quatro empresas do setor de
hidrocarbonetos estava previsto desde o decreto de nacionalização assinado em 1º de maio
de 2006 por Morales.
A volta das quatro empresas
às mãos do Estado é a última
parte a ser implementada do
decreto de nacionalização de
2006. No final daquele ano, o
governo boliviano assinou novos contratos de exploração de
gás e, há cerca de um ano, retomou as duas refinarias que pertenciam à Petrobras.
A principal surpresa do dia
foi a nacionalização da Entel, a
maior empresa de telecomunicação do país, privatizada há 12
anos. Desde o ano passado, o
Estado boliviano e a Telecom
Itália travam uma batalha judicial pelo controle acionário de
47% das ações pertencentes a
fundos de pensão. Ao justificar
a decisão, Morales disse que a
empresa se recusou a negociar.
As nacionalizações de Morales foram anunciadas três dias
antes do referendo sobre autonomia convocado pelo oposicionista departamento de Santa Cruz, cujo resultado pode
fragilizar a força política do
presidente boliviano.
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