São Paulo, quarta, 2 de julho de 1997.



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ANOS DE CHUMBO
Autor, condenado por envolvimento com terroristas, decidiu voltar a seu país e cumprir resto de pena
Italianos prendem filósofo Negri no avião

ROBERTA BARNI
especial para a Folha, de Roma

O filósofo Antonio Negri, 64, regressou ontem à Itália, seu país natal, após 14 anos de auto-exílio na França. Foi preso pela polícia ainda no avião, no aeroporto internacional de Roma, e levado à prisão de Rebibbia, a maior da Itália, onde estão ex-terroristas de esquerda e de direita.
Negri já havia anunciado sua volta. Na Itália, ele está condenado por associação subversiva e organização de grupos de guerrilha urbana. É tido pela Justiça como uma dos líderes do grupo terrorista Brigadas Vermelhas e um dos assassinos de Aldo Moro, em 1978 (leia texto abaixo).
Negri, autor de mais de 20 livros e de uma coluna mensal no Mais!, já cumpriu quatro anos e três meses da sua pena, mas ainda restam quatro anos e 11 meses de reclusão.
O anúncio da volta de Negri reabriu na Itália a discussão sobre os "anos de chumbo" do terrorismo, que abalou o país na década de 70 e no começo dos anos 80. Negri diz que voltou para chamar a atenção sobre a situação de condenados e exilados daquela época.
Antes de deixar seu amplo apartamento, em um bairro nobre de Paris, houve uma festa de despedida, organizada pelos amigos franceses e por cerca de 180 italianos condenados por terrorismo e refugiados políticos em Paris. Segundo os convidados, foi uma festa melancólica. "Estou me sentindo como o último japonês a se render, numa guerra que terminou há muito tempo", disse Negri.
Ele embarcou em um vôo da Alitália às 10h30 (5h30 em Brasília). Após a aterrissagem em Roma, o avião foi estacionado num pátio isolado. Os passageiros desceram, enquanto Negri e seus acompanhantes permaneceram a bordo.
Então, sete policiais subiram e notificaram o professor da ordem de prisão. Às 12h50, Negri desceu do avião. Vestia blazer azul marinho, calça jeans e camisa listrada e levava consigo uma maleta de couro. As autoridades evitaram o contato entre o filósofo e a imprensa.
Ao chegar a Rebibbia, Negri foi submetido aos trâmites burocráticos da entrada; em seguida passou por controle médico e psicológico.
A legislação italiana não prevê celas especiais, mas havia a expectativa de que Negri pudesse ter regalias, como uma cela privativa. Seu único pedido, entretanto, foi o de ter acesso à biblioteca, para poder continuar sua atividade intelectual. Levou as anotações de trabalho, alguns livros do poeta Giacomo Leopardi e o clássico latim "De Rerum Natura", de Lucrécio.
"Ele está em boas condições físicas e psicológicas, embora não seja fácil para ninguém enfrentar uma situação destas", relatou à Folha o deputado Paolo Cento, do Partido Verde, que no começo da tarde conseguiu um encontro de 15 minutos com Negri na prisão.



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