São Paulo, domingo, 02 de agosto de 2009

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Governo de unidade tira Zimbábue do fundo do poço

Avanços econômicos e administrativos convivem com violência e prisões políticas

União Europeia sinaliza com retomada do diálogo oficial após 6 meses de governo do presidente Robert Mugabe e do premiê Morgan Tsvangirai

AMARO GRASSI
DA REDAÇÃO

Na última quinta, o Conselho de Segurança Nacional do Zimbábue realizou o primeiro encontro desde a sua criação, há cerca de seis meses, para cumprir a função de submeter a cúpula militar ligada ao presidente Robert Mugabe ao novo governo de unidade, chefiado pelo premiê Morgan Tsvangirai.
A reunião, cercada de expectativa, foi precedida de uma série de manifestações entre os militares, para evitar dar a ideia de que quem manda hoje no país é Tsvangirai, líder do MDC (Movimento pela Mudança Democrática) e pivô da crise que tomou o país em 2008.
No ano passado, a vitória de Tsvangirai sobre Mugabe no primeiro turno da eleição presidencial foi o estopim de uma onda de repressão à oposição, que culminou com a desistência do agora premiê de participar do segundo turno.
Em setembro, após intensas pressões internacionais, foi assinado um acordo entre os rivais para o estabelecimento de um governo de divisão de poder, que assumiu em fevereiro.
De fato, o ex-líder opositor não detém o controle do país. Mas os últimos dois meses, que completaram o primeiro semestre do governo que uniu os rivais Tsvangirai e Mugabe -no poder desde 1980-, foram generosos em sinais de que algo pode estar começando a mudar, ainda que lentamente.
Há duas semanas, o ministro das Finanças, Tendai Biti, ligado ao premiê, anunciou um aumento ao funcionalismo público de 55% e previu para esse ano um crescimento de 3,7%.
O desempenho é particularmente promissor para um país que viu a economia ter crescimento negativo desde o início da década, sobretudo após as polêmicas desapropriações de terra de Mugabe. No ano passado, o PIB recuou 12,6%.
A inflação, que alcançava incalculáveis seis dígitos ao mês, foi controlada com a substituição do dólar zimbabuano pelo dólar americano e pelo rand sul-africano. Prateleiras, à época esvaziadas, voltam a oferecer produtos aos zimbabuanos.
Recentemente, após um giro de Tsvangirai pela Europa, a União Europeia deu sinais de que pode retomar o diálogo oficial com o país, alvo de sanções por violação de direitos humanos. E uma missão do FMI (Fundo Monetário Internacional) no país disse ver uma "nascente recuperação econômica".

Violência política
Mas o cenário não é tão alentador assim. Após seis meses do que deveria ser um governo de reconciliação, crescem relatos de violência política, sobretudo no interior, e prisões de políticos do MDC a pedido de uma Promotoria sobre a qual Mugabe reluta em ceder seu poder.
O recrudescimento da situação é apontado ainda como o principal fator para o pé atrás dos investidores internacionais ocidentais em voltar ao Zimbábue -o vácuo deixado já começa a ser ocupado pela China.
Segundo o ministro das Finanças, serão necessários entre US$ 8 bilhões e US$ 10 bilhões para reconstruir o país. Hoje, a pouca ajuda que chega ainda é para trabalho humanitário.
Rixas estão também na origem do bloqueio que sofre o processo constituinte, instituído pelo governo de unidade, que prevê uma nova Carta até julho de 2010 e a posterior convocação de eleições gerais.
Para Roger Southall, professor de Sociologia da Universidade de Witwatersrand, em Johannesburgo, o impasse reside no fato de "Mugabe estar essencialmente em controle das instituições do Estado", como as Forças Armadas, a polícia e o funcionalismo mais antigo.
"Tsvangirai e o MDC terão que erodir o controle [do presidente Mugabe] a partir de cima. E esse é um processo complicado", afirmou Southall à Folha.


Texto Anterior: Honduras: Morre professor baleado na quinta
Próximo Texto: Imprensa: País acerta volta de TVs internacionais e alivia restrições
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.