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CABUL
LIVRE MERCADO
Bons negócios florescem na capital afegã
Com a saída do Taleban, explodem oportunidades represadas pelas rigorosas proibições da milícia
IGOR GIELOW
ENVIADO ESPECIAL A CABUL
Poucas semanas após a saída do
Taleban de Cabul, alguns negócios estão virando minas de ouro
para seus proprietários devido às
mudanças nas regras comportamentais na capital afegã.
""É uma ótima oportunidade,
mas na verdade ainda tenho um
pouco de receio de fazer mais propaganda", disse Reza Hamid, 28,
dono de uma barbearia convertida em um dos primeiros salões de
beleza feminino na era pós-Taleban.
O salão não tem nome ainda
-mas nenhuma barbearia o tem
em Cabul. A primeira cliente, diz
Hamid, foi uma prima sua que
veio cortar o cabelo ao estilo ondulado da estrela de cinema indiana Sharuka. O corte foi feito no
dia 15, dois dias depois da chegada da Aliança do Norte.
A prima, porém, saiu e entrou
de burga. ""É muito cedo ainda",
diz. O custo por corte é de 15 mil
afeganis, algo como US$ 4 pelo
flutuante câmbio afegão.
O salão não tem, porém, apetrechos de manicure ou pedicuro
ainda.
""Preciso contratar mulheres,
mas não sei onde", afirmou Hamid. O mesmo problema atinge
um outro ramo que vai tentar decolar, o das comunicações.
"Experiência"
A Afghan Wireless Company,
uma empresa de telefonia celular
com escritórios em Cabul e Candahar montada por dois afegãos e
um norte-americano, anunciou
na Rádio Afeganistão vaga para 15
telefonistas.
Os requisitos eram curso técnico completo e uma piada: experiência de cinco anos, exatamente
o tempo em que o Taleban ficou
no cidade, vetando o trabalho feminino. ""Estamos reconsiderando", afirmou um secretário à porta da empresa.
No salão de Hamid, uma mulher chegou, de burga, enquanto a
Folha esteve no local. Não quis
conversa. Era a primeira do dia: a
média é de duas, por enquanto.
""Tudo vai ficar mais fácil depois
do mês sagrado do Ramadã,
quando alguns hábitos ficam
mais liberais."
O salão de Hamid fica na avenida conhecida com Zarinab, batizada informalmente em homenagem ao cinema que deu lugar agora a um hotel de terceira categoria, no bairro de Sharina, entre
uma loja de flores e um mercadinho de frutas.
Mais visibilidade têm as barbearias, um negócio que floresce na
capital afegã após a queda do Taleban.
Movimento
A milícia, em édito publicado
em dezembro de 1996, afirmava
que a ""barba deve ser mantida
grande, e quem desafiar a lei deverá ser preso até que a barba cresça
o suficiente".
""Eu aumentei meu faturamento. Há dias em que atendo até três
vezes mais fregueses do que antes.
Estou bem contente com tudo isso", afirmou Mehrullah Abdullah, um barbeiro de 49 anos que
há 14 trabalha em uma espécie de
contêiner numa loja comercial do
bairro Makrorian 2.
Abdullah atende hoje a cerca de
20 pessoas por dia. ""Foram cerca
de 50 no dia em que o Taleban se
foi."
Quando a reportagem chegou,
as três cadeiras de barbeiro estavam ocupadas e havia uma fila de
quatro outras pessoas na espera.
Pilotando as cadeiras, Abdullah
e seus filhos Nurallah, 20, e Zabiullah, 18.
""Sempre quis trabalhar com
meu pai, mas não dava porque
não tinha gente suficiente", contou o caçula, ainda sem barba suficiente para fazer sozinho.
Capitalismo
A única vez em que Zabiullah
havia trabalhado, antes da saída
da milícia, foi quando a Marouf
(polícia religiosa do Taleban)
trouxe dez pessoas para cortar o
cabelo.
""Disseram que o cabelo abaixo
do ombro era pecado", afirmou.
Resultado: todos tiveram os cabelos cortados rente, e tiveram de
pagar a conta de 5.000 afeganis cada.
O incipiente capitalismo pós-Taleban mudou algo mais do que
a frequência do salão. Agora, com
a procura, o preço do corte no salão de Mehrullah já subiu para 10
mil afeganis.
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