São Paulo, sábado, 02 de dezembro de 2006

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Calderón toma posse entre apitos e vaias

Cerimônia no Congresso dura apenas quatro minutos por causa de protesto realizado por parlamentares da oposição

Acuado pela esquerda, que aponta manipulação e fraude na eleição, conservador não pôde discursar para congressistas

RAUL JUSTE LORES
ENVIADO ESPECIAL À CIDADE DO MÉXICO

Durou apenas quatro minutos a posse do novo presidente do México, o conservador Felipe Calderón, do Partido da Ação Nacional (PAN). Entre vaias, apitos e gritos da oposição, Calderón não pôde fazer o longo discurso que pretendia. Fez apenas um curto juramento, cantou o hino nacional com os parlamentares e se retirou.
Constrangido, o presidente Vicente Fox passou a faixa para seu sucessor. Os deputados da esquerda, que acusam fraude na vitória eleitoral do conservador, em julho, gritavam: "Fora, Fox!", e, para o novo presidente mexicano: "Espúrio, espúrio" e "Vai cair, vai cair".
Já os deputados da direita comemoravam a rápida e bagunçada cerimônia, gritando "sí, se pudo" (algo como "sim, deu pra fazer"). É que, até cinco minutos antes da cerimônia, não se sabia se haveria ou não o juramento.
Às oito da manhã (12h em Brasília), cenas de pugilato e até arremessos de cadeiras foram vistos no plenário, quando o senador Santiago Creel, homem forte do governo Fox, chegou ao recinto. A oposição vaiou com força e partiu para cima. A posse estava marcada para as 9h30.

Congresso sitiado
Na última semana, com receio de que a esquerda tomasse a tribuna do Congresso para impedir a posse, a direita se adiantou - e praticamente acampou por três dias e noites na tribuna. A esquerda não deixou por menos - acampou em cinco dos seis acessos ao plenário do Congresso. O único acesso que ficou sob controle dos conservadores está atrás do palco, sob duas gigantes bandeiras mexicanas. Por essa portinha escondida é que Calderón teve que entrar e sair.
Em setembro, o então presidente Fox não pôde realizar o tradicional discurso sobre o estado da nação porque a esquerda havia tomado a tribuna. Ele entregou o relatório por escrito e foi embora.
Calderón foi eleito em 2 de julho, com apenas 200 mil votos a mais que o esquerdista Andrés Manuel López Obrador, ex-prefeito da Cidade do México.
A esquerda denunciou fraude, manipulação e intromissão do governo federal na campanha e na apuração e organizou um protesto que bloqueou as principais avenidas da capital, exigindo recontagem total dos votos, que não foi feita.
Calderón só foi confirmado presidente em setembro - quando parte da população também já criticava duramente o bloqueio por sete semanas da capital, promovido por López Obrador, que tampouco apresentou provas irrefutáveis de fraude eleitoral.
A popularidade do esquerdista encolheu, e antigos seguidores passaram a chamá-lo de populista e de messiânico. Mas as críticas da esquerda a todo o processo eleitoral continuaram.
Um protocolo confuso foi feito na medida para evitar constrangimentos. Pela primeira vez na história do México, o presidente Fox passou o cargo para Calderón na madrugada de quinta para sexta-feira, à meia-noite, em cerimônia transmitida pela tevê, já se prevenindo contra o que poderia acontecer no Congresso na manha seguinte.
A segurança foi redobrada. Para chegar ao Congresso, deputados, senadores, convidados, autoridades estrangeiras e jornalistas passaram por até sete diferentes controles.

Comemoração fechada
Mas, apesar de ser feriado no país, as ruas ficaram vazias e o novo presidente tampouco desfilou de carro aberto. A comemoração de Calderón não poderia ser mais discreta -e menos popular.
As grandes cerimônias aconteceram em lugares fechados, só para convidados. Em uma celebração no Auditório Nacional, repleto de correligionários, Calderón leu o discurso que não pôde fazer no Congresso. Depois houve um almoço no suntuoso Museu Nacional de Antropologia e estava marcado um jantar no Castelo de Chapultepec.
Ele se referiu à oposição no auditório. "Estou acostumado a enfrentar e superar todos os obstáculos. Vou dialogar com quem estiver disposto a dialogar, mas não vou esperar o diálogo para começar a trabalhar. Não se pode invocar a democracia para se atentar contra a democracia", discursou o novo presidente mexicano.
O mandato de Calderón à frente da Presidência do país será de seis anos. Não há reeleição no México.


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