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ONU
Para Sylvia Steiner, aversão americana ao Tribunal Penal Internacional será superada
EUA ainda aderirão ao TPI, diz juíza
RODRIGO UCHÔA
DA REDAÇÃO
Os Estados que ratificaram o
Tribunal Penal Internacional
(TPI) começam hoje, em Nova
York, a escolher os 18 juízes que
comporão o órgão. A candidata
brasileira, Sylvia Helena de Figueiredo Steiner, 50, desembargadora federal (Tribunal Regional
Federal da 3ª Região-SP), tem
chances significativas de ser escolhida entre os 56 candidatos.
Nas primeiras quatro rodadas
da eleição, os Estados-parte têm
de respeitar algumas cotas, que
são as de representação por grupo
geográfico, por gênero e, depois,
por especialidade (em direito internacional e em direito penal).
"O TPI tem a preocupação de trazer a perspectiva da mulher para
seus julgamentos", diz Steiner.
Ela considera que o tribunal
nasce fortalecido, apesar da ausência dos EUA. Dizendo-se otimista, a desembargadora crê que
Washington ainda aderirá à corte.
Paulistana, divorciada, bacharela e mestra em direito internacional pela USP, Sylvia Steiner está
nos EUA para assistir às votações.
Leia a seguir trechos da entrevista
que deu à Folha por telefone.
Folha - O TPI nasce prejudicado
pela não-participação dos EUA?
Sylvia Helena de Figueiredo Steiner - Acho que o TPI está nascendo bastante fortalecido, pois tem a
ratificação de todos os países da
União Européia, da maior parte
da América Latina e de nações
importantes, como o Canadá.
Mas creio ser importante que,
no médio ou no longo prazo, os
EUA se juntem ao tribunal. Entendemos a necessidade de que o
TPI seja realmente universal.
Como tradicionalmente os EUA
têm dificuldades em aceitar a jurisdição internacional, acho que
uma das principais tarefas da primeira composição do tribunal será mostrar que é imparcial, que
não surge para perseguir injustamente soldados americanos.
Sou uma otimista. Penso que os
EUA acabarão aderindo.
Folha - Juristas americanos criticam a adesão dizendo que ela implicaria a entrega de parte da soberania do país e que um tribunal internacional poderia ser influenciado por antiamericanismo.
Steiner - A situação atual, em
que um tribunal "ad hoc" da
ONU pode ser instalado a qualquer tempo, como os para crimes
contra a humanidade cometidos
em Ruanda e na ex-Iugoslávia, é
muito mais invasiva da soberania
do que a adesão voluntária a uma
corte permanente. A questão não
está ligada à soberania, mas ao
exercício de forças de poder dentro das relações internacionais.
Folha - E a influência política nos
julgamentos?
Steiner - As figuras criminais do
Estatuto de Roma são muito claras. Pretendemos que o tribunal
não sofra influências políticas.
Não sei trabalhar com política,
não quero ter de trabalhar com
política. Se houver injunções políticas, eu serei a primeira a combater o tribunal.
Se for para ter influência política, que tudo fique como está, com
o Conselho de Segurança da ONU
podendo instalar tribunais "ad
hoc" onde quiser.
Folha - Suas chances foram maximizadas por ser mulher?
Steiner - O que se diz é que há
uma grande chance de que as mulheres sejam eleitas logo no primeiro escrutínio, o que significaria a eleição de ao menos 6 das 10
candidatas.
Folha - Por que isso?
Steiner - Como as mulheres tradicionalmente são duplamente
vitimadas pela guerra, a idéia é de
que juízas possam levar ao tribunal a perspectiva de gênero. Isso
vem da experiência dos tribunais
"ad hoc" de Ruanda e da ex-Iugoslávia: a quantidade de mulheres que aparecem como testemunhas de violências adicionais nesses tribunais fez inclusive com
que o tribunal de Ruanda reconhecesse que o estupro pode ser
uma forma de genocídio.
As mulheres perdem os maridos, passam fome, têm de trabalhar duplamente para sustentar os
filhos e ainda são vítimas de estupro e de violências sexuais inimagináveis, pois acabam fazendo
parte do butim. Mas não é só isso.
O Estatuto de Roma não traz
apenas as figuras de crimes contra
mulheres e de crime de escravidão sexual, traz também a figura
dos crimes de desaparecimento
forçado. Sabemos que, na América Latina toda, tivemos essa experiência recentemente.
Ele acaba consagrando uma série de novos crimes que causam
sofrimento desnecessário às populações vítimas de conflitos. São
conquistas importantes.
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