São Paulo, terça-feira, 03 de fevereiro de 2009

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Lítio atrai montadoras estrangeiras à Bolívia

País tem a maior reserva mundial do mineral, usado na produção de baterias para carros elétricos que devem rivalizar com a gasolina

Conglomerados japoneses e francês já conversam com governo Morales, que quer manter controle da reserva; índios pedem participação

SIMON ROMERO
DO "NEW YORK TIMES", EM UYUNI, BOLÍVIA

Na corrida para desenvolver a próxima geração de carros híbridos ou elétricos, um obstáculo se coloca diante de montadoras e governos ansiosos por reduzir sua dependência do petróleo: quase metade do lítio -mineral usado nas baterias dos veículos- do mundo está na Bolívia, onde o sentimento nacionalista em torno das reservas cresce rapidamente.
Empresas japonesas e europeias já vêm tentando fechar acordos para explorar o mineral, enquanto o governo Evo Morales fala em controlar as reservas e manter os estrangeiros longe. Para aumentar a pressão, grupos indígenas em Uyuni, no longínquo deserto salino onde estão os depósitos do mineral, querem uma participação na riqueza a ser obtida.
"Sabemos que a Bolívia pode virar a Arábia Saudita do lítio", disse Francisco Quisbert, 64, líder do Frutcas, cooperativa de extratores de sal na extremidade de Uyuni, o maior planalto salino do mundo. "Somos pobres, mas não somos burros", disse. "O lítio pode pertencer à Bolívia, mas também é nosso."
A nova Constituição, aprovada em referendo em janeiro, embasa a reivindicação. Um de seus artigos dá aos indígenas o controle sobre os recursos naturais em seus territórios, o que lhes possibilita inclusive bloquear projetos de mineração.
Mas nada disso desencoraja os grupos estrangeiros, incluindo os conglomerados japoneses Mitsubishi e Sumitomo e um grupo liderado por um industrial francês, Vincent Bolloré. Nos últimos meses os três enviaram representantes a La Paz para discutir o acesso ao lítio.
"Há lagos salinos no Chile e na Argentina e depósitos promissores no Tibete, mas está claro que a maior reserva fica na Bolívia", disse em La Paz Oji Baba, executivo da Unidade de Metais de Base da Mitsubishi. "Se quisermos ser uma força na próxima geração de carros, temos que estar aqui."

Investimento
A Mitsubishi não é a única que pretende produzir carros com baterias de lítio-íon. Montadoras americanas colocam suas esperanças no mineral. A General Motors pretende lançar em 2010 um carro com bateria de lítio-íon e motor a gasolina. Nissan, Ford, BMW e outras têm projetos similares.
A demanda pelo mineral, usado há muito tempo em quantidades pequenas em medicamentos estabilizadores de humor e armas termonucleares, tem crescido com sua utilização em baterias de celulares multifunções e outros eletrônicos. Mas a indústria automotiva tem o maior potencial de emprego do lítio. Mais leve que o níquel, ele daria aos carros elétricos autonomia maior.
O Instituto de Pesquisas Geológicas dos EUA diz que 5,4 milhões de toneladas de lítio podem ser extraídos na Bolívia, contra 3 milhões no Chile, 1,1 milhão na China -hoje a maior produtora mundial- e 410 mil nos Estados Unidos.
Saúl Villegas, diretor de uma divisão da unidade encarregada da extração de lítio Comibol, a estatal boliviana de mineração, diz que "o modelo imperialista de exploração dos recursos nunca mais será repetido". Mas admite que estrangeiros poderiam ser sócios minoritários.
A agência está investindo US$ 6 milhões numa pequena fábrica perto do povoado de Rio Grande, na margem da salina de Uyuni, onde espera lançar o primeiro esforço boliviano em escala industrial para extrair e processar lítio, convertendo-o em carbonato utilizável em baterias. Morales quer que a fábrica fique pronta neste ano.
Analistas dizem, no entanto, que o país, o mais pobre da América do Sul, precisará investir centenas de milhares de dólares para começar a produzir carbonato. "Temos as maiores reservas de lítio do planeta, mas, se não entrarmos na corrida já, perderemos essa chance", disse o economista Juan Carlos Zuleta, de La Paz. "O mercado achará outras soluções."

Tradução de CLARA ALLAIN



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