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Colonos vêem ocupação como desígnio divino
DO ENVIADO ESPECIAL À CISJORDÂNIA
Cerca de 300 famílias movidas pela convicção religiosa
moram neste pequeno assentamento israelense situado numa
colina com vista privilegiada
para a cidade palestina de Ramallah. Ruas limpas, casas amplas e uma população ortodoxa
formam o cenário de Psagot,
uma das 120 colônias judaicas
na Cisjordânia.
Em Psagot, a crença em um
milagre divino que tomou conta do país após a vitória israelense de 1967 continua muito
viva. A poucos quilômetros dali, milhares de refugiados palestinos têm amargas lembranças
da mesma guerra.
Quem vive em Psagot não se
importa com a acusação freqüente de que sua presença nos
territórios palestinos é o maior
obstáculo para a obtenção de
um acordo de paz. "Nada acontece por acaso", diz Avi Rohe,
vice-prefeito de Psagot. "A espetacular vitória em 1967 foi
uma janela aberta por Deus para que voltássemos à terra de
nossos antepassados."
O discurso religioso de Rohe
é característico entre os cerca
de 300 mil colonos judeus que
vivem em meio à população de
2,4 milhões de palestinos na
Cisjordânia. Para eles, mesmo
sem o apoio da maioria dos israelenses, que preferia se ver livre de um projeto que consideram fracassado, os assentamentos vieram para ficar.
A retirada unilateral de Gaza,
em 2005, que significou o fim
de 21 assentamentos, não esmoreceu os colonos, pelo contrário. A violenta disputa entre
facções palestinas desde a eleição do grupo radical Hamas, no
ano passado, e os foguetes disparados diariamente de Gaza
contra Israel ajudaram a engavetar a proposta de retirada
também da Cisjordânia. E deu
novo fôlego político à antiga tese de que cessão de territórios é
sinônimo de insegurança.
"Não tenho dúvidas de que o
futuro do povo judeu é aqui",
diz Amos Erlich, 73, um dos
fundadores de Psagot, em 1981.
Erlich, que lutou perto de Belém a Guerra dos Seis Dias, não
vê contradição entre a sua fé e o
raciocínio matemático que está
habituado a usar como professor de cálculo da universidade
Tel Aviv. "É uma pena que a
maioria dos israelenses já não
entenda o perigo de conceder
terras aos árabes."
Perto dali, duas tragédias palestinas se misturam no campo
de refugiados de Kalandia, a
pouco mais de 10 km de Jerusalém. Entre os que chegaram em
1948, após a criação de Israel, e
em 1967, na Guerra dos Seis
Dias, o que há em comum é o
ódio ao Estado judeu e a esperança de retornar às casas perdidas no conflito.
Muitos dos que chegaram lá
há 40 anos ainda andam com as
chaves de suas antigas casas
penduradas no pescoço, um peso que os impede de pensar em
reconciliação. Crianças jogam
bola nas ruas empoeiradas, enquanto adultos desempregados
dividem histórias da ocupação.
Protegido do sol forte na
sombra de uma marquise, o pedreiro Abu Shashi, refugiado de
1967, conta que são raras as famílias de Kalandia que não perderam filhos em choques com o
Exército israelense.
"Quando estourou a guerra
fui obrigado a abandonar minha casa com a roupa do corpo.
Ninguém esquece uma coisa
dessas", diz Shashi, que tinha 18
anos quando chegou com a família a Kalandia vindo de Jaffa.
Entre Gaza e Cisjordânia -
territórios palestinos ocupados
por Israel-, a ONU contabiliza
1,6 milhão de refugiados. Em
outros campos, na Síria, na Jordânia e no Líbano, há outros 2,6
milhões.
(MN)
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