São Paulo, domingo, 03 de setembro de 2000


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VIZINHO EM CRISE

Farc querem tranquilizar países limítrofes com a Colômbia; conflitos deixam pelo menos 65 mortos

Guerrilha promete não entrar no Brasil



THOMAS TRAUMANN
DA REPORTAGEM LOCAL

As Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) prepararam um documento em que se comprometem a não entrar no Brasil mesmo com o agravamento do conflito na Colômbia.
A decisão de tranquilizar o Brasil foi tomada pelo comando da guerrilha depois que o governo brasileiro anunciou que irá reforçar a fronteira entre os dois países.
"Queremos tranquilizar nossos vizinhos. O território de nossa luta é a Colômbia. É nossa posição programática que a luta popular deve ser travada dentro do país", afirmou o comandante Iván Reis, da executiva das Farc.
De fato, um ataque das Farc a um centro de comunicação do Exército colombiano deixou pelo menos 65 mortos, entre sexta-feira e ontem. Segundo o Exército, 50 dos mortos eram guerrilheiros e quinze, militares.
A intenção da guerrilha é evitar a internacionalização da guerra civil, que deve se acirrar nas próximas semanas. Os guerrilheiros acreditam que ações em países vizinhos provocariam o envio de forças internacionais para ajudar o governo colombiano -incluindo soldados norte-americanos.
Documentos semelhantes devem ser enviados para Venezuela, Peru, Panamá e Equador -os demais vizinhos da Colômbia. Mas os parceiros estratégicos são o Brasil e a Venezuela, vistos pela guerrilha como mais independentes dos EUA, o grande apoiador do governo colombiano.
As Farc desconfiam do Equador (por manter uma base militar norte-americana), do Panamá (pela tradição política pró-EUA) e do Peru (que montou um gigantesco aparato para derrotar a sua própria guerrilha interna).
"O Brasil pode ficar seguro de que não haverá incursões nossas dentro do país. A nossa luta é na Colômbia", afirmou à Folha no mês passado o porta-voz oficial das Farc, comandante Raúl Reyes. Na semana passada, sua assessoria reafirmou a declaração.
A possibilidade de uma invasão do Brasil consta de estudos do Ministério das Relações Exteriores, do Gabinete de Segurança Institucional e da Polícia Federal. Para o governo brasileiro, as Farc poderão se refugiar no Estado do Amazonas se forem derrotadas.
Foram destacados cerca de 6.000 soldados do Exército e agentes da Polícia Federal para a operação de vigilância dos 1.640 km de fronteira entre os países, quase toda ocupada pela floresta amazônica e sem sinalização sobre as divisas.
A viagem de barco entre San Vicente del Caguán, capital do território das Farc, até Tabatinga demora dois dias. A cidade colombiana mais próxima do Brasil é Letícia, vizinha de Tabatinga, mas ali não há guerrilha.
O confronto entre as Farc e o governo da Colômbia tem 36 anos. O Exército prepara uma gigantesca operação militar no sul do país para combater o narcotráfico, mas miram a guerrilha.
Na semana passada, a Colômbia recebeu do governo norte-americano o cheque de US$ 1,3 bilhão de doação para o programa antitráfico chamado Plano Colômbia.
O local escolhido para o início das ações é o Estado de Putumayo, controlado pelas Farc. O governo acusa os rebeldes de serem financiados pelos traficantes em troca de proteção. As Farc admitem que cobram "impostos" dos plantadores de coca, mas negam relação com a comercialização.

Invasão e morte
O último registro de invasão do Brasil por guerrilheiros das Farc terminou com 12 mortos. Em fevereiro de 1991, cerca de 40 atacaram o posto do Exército no rio Traíra, no Amazonas.
Três militares que estavam de sentinela foram mortos, e outros 12 ficaram feridos. Dois garimpeiros que estavam detidos também morreram. Poucos dias depois, sete colombianos foram mortos por militares brasileiros.
Em outubro de 1998, a Força Aérea colombiana invadiu o Brasil e ocupou a base militar de Iauaretê (AM) para combater as Farc. Os guerrilheiros haviam tomado a capital do Estado do Amazonas colombiano, Mitú, e o Exército colombiano não tinha base próxima para atacá-los.
O Brasil reclamou e, desde então, a Colômbia avisa quando faz manobras próximas à fronteira. O Brasil já decidiu que não cederá bases militares para a luta colombiana contra a guerrilha.
Um dos principais objetivos políticos das Farc é serem reconhecidas como um "Estado beligerante" -ou seja, um Estado autônomo do governo central colombiano, com território e relações diplomáticas independentes.
No ano passado, as Farc tentaram abrir uma embaixada em Brasília, programar uma viagem oficial do comandante Raúl Reyes ao Brasil e agendar uma visita do presidente Fernando Henrique Cardoso a San Vicente del Caguán. Nada foi aceito.


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