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ANÁLISE
O subdesenvolvimento explica
CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A LONDRES
A mais sintética -e nem por
isso menos certeira- definição
para os formidáveis esforços
que o presidente colombiano
Álvaro Uribe e seus seguidores
desenvolvem para obter a re-reeleição é do ex-deputado liberal Jaime Castro: "O que está
ocorrendo é uma demonstração de subdesenvolvimento político muito grande".
Bingo. A América Latina, que
transitou com razoável segurança e velocidade, do autoritarismo para a democracia a partir dos anos 80, não conseguiu
passar à etapa seguinte: a substituição ou, na pior das hipóteses, uma convivência mais
equilibrada entre instituições
fortes e homens do destino.
Ou caudilhos que se acham
insubstituíveis, a sua mais persistente figura política.
O vício da perpetuação não
distingue corrente política ou
ideológica, não é diferente na
direita ou na esquerda ou até
no centro.
Basta lembrar que quem
rompeu, no Brasil, a tradição de
que reeleição era vetada (mesmo uma só) foi Fernando Henrique Cardoso. No dia em que
ele tomaria posse, 1º de janeiro
de 1995, já desembarcou em
Brasília com o projeto para introduzir a reeleição o deputado
pernambucano Maurílio Ferreira Lima (PSDB).
Ressalve-se que FHC não
tem características caudilhescas, no sentido de apelo popular. Mas o grupo que chegava ao
poder via nele e, acima de tudo,
no Plano Real que ele encarnava, a melhor chance de ficar 20
anos no poder, como chegou a
dizer Sérgio Motta, o braço direito de FHC até morrer.
Antes, na Argentina, Carlos
Menem também obteve o direito a disputar a reeleição, igualmente amparado num fenômeno econômico (a paridade entre o peso e o dólar, que acabara
com a inflação e, por extensão,
com surtos devastadores de hiperinflação).
Não importa que esse modelo contivesse o germe da destruição econômica e social que
viria já no fim do segundo mandato de Menem. Importava era
a continuidade.
Só depois é que a esquerda latino-americana aderiu à onda,
nas figuras de Hugo Chávez,
Rafael Correa e Evo Morales.
Daniel Ortega, na Nicarágua,
está ainda na fase de tentativa.
Nesses casos, trata-se de caudilhismo puro e duro. Não há
"chavismo" sem Chávez, como
não houve varguismo sem Getulio Vargas, no Brasil, ou peronismo sem Juan Domingo Perón na Argentina (o que existiu
depois dele foi sempre um saco
de gatos, que se matavam literalmente uns aos outros durante o governo de Isabelita Perón
e, agora, se enfrentam nas urnas com menos sangue real,
mas uma contundência retórica parecida).
Posto de outra forma: não há
correntes de opinião organizadas na forma de partidos que
possam levar a bandeira quando o caudilho morre ou deixa o
poder, seja qual for a razão.
Mesmo no Brasil, em que o
caudilho Luiz Inácio Lula da
Silva renunciou, ao que tudo indica, a aceitar o que Uribe agora
busca (a re-reeleição), seu
substituto não é um histórico
do partido em que Lula sempre
militou. Na verdade, Dilma
Rousseff é candidata do "lulismo", não do petismo, ainda que
o PT a aceite porque é abençoada pelo chefe, dotado de imensa
popularidade.
O subdesenvolvimento
apontado por Jaime Castro é
até explicável. Democracia é
um jogo recente no subcontinente. Nos Estados Unidos,
mais de 200 anos de prática levaram a uma estabilidade que
permite proibir para sempre a
volta de um presidente depois
de cumpridos dois mandatos
sucessivos.
Bill Clinton, por exemplo, tinha popularidade suficiente
para ser melhor candidato que
John Kerry, quando este disputou, pelos democratas, contra
George Walker Bush que buscava a reeleição. Mas não podia
competir. Nem por isso, o Partido Democrata desapareceu.
Voltou com Barack Obama
quatro anos depois. E ganhou.
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