São Paulo, domingo, 03 de novembro de 2002

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OS EUA VOTAM

Se os republicanos vencerem a eleição legislativa, país deve retomar agenda do "conservadorismo com compaixão"

Bush aposta nas urnas para voltar às origens

MARCIO AITH
DE WASHINGTON

Se assumir o controle do Senado nas eleições de terça-feira, o Partido Republicano promete retomar com ênfase a bandeira do "conservadorismo com compaixão", que elegeu o presidente George W. Bush há dois anos e ficou relegada a um segundo plano depois dos atentados terroristas de 11 de setembro de 2001.
"Se ganharmos, vamos recuperar essa bandeira e implementá-la com todas as forças", disse o líder republicano no Senado, Trent Lott. A agenda inicial é ambiciosa. Os republicanos pretendem tornar permanentes os cortes de impostos aprovados em 2001, restringir o direito ao aborto, limitar indenizações judiciais contra corporações, viabilizar a privatização de parte da Previdência Social e nomear juízes conservadores para as cortes superiores.
Nas eleições, estarão em jogo 34 das 100 cadeiras do Senado e todas as 435 na Câmara dos Representantes (deputados). Os democratas precisam de mais dez cadeiras para assegurar, sem a ajuda de nenhum independente, a maioria na Câmara. No Senado, basta aos republicanos adicionar um único senador à sua bancada para retomar o controle da Casa.
Para ajudar os candidatos republicanos, Bush começou na quinta-feira uma viagem por 15 Estados e já coletou pessoalmente mais de US$ 136 milhões, transformando-se no presidente mais empenhado (em viagens e valor arrecadado) numa eleição parlamentar de que se tem notícia.
Se os republicanos retomarem o Senado, será a primeira vez, desde 1953, que um presidente do partido terá o controle simultâneo das duas Casas do Legislativo por pelo menos dois anos.
Se isso ocorrer, Bush poderá executar sem freios sua plataforma. Uma parte dela pôde ser implementada durante os primeiros quatro meses de seu governo, de janeiro a maio de 2001, antes de o senador republicano Jim Jeffords abandonar o partido, fazendo-o perder o controle do Senado.
Nesse período, o Congresso aprovou cortes de impostos pelo prazo de dez anos e revogou leis ambientais e trabalhistas.
"Bush tem um projeto ambicioso para o país", disse Charles Cook, analista e autor de uma das mais famosas publicações sobre política em Washington.
"Mas há dois obstáculos no caminho do presidente", afirma.
O primeiro são as preocupações com o desempenho da economia. Desde julho, a porcentagem dos americanos que elegeram esse tema como prioridade máxima subiu de 13% para 20%, segundo pesquisa da rede CBS e do "New York Times". O terrorismo caiu de 17% para 14%.
O segundo obstáculo são os precedentes históricos, que não favorecem o presidente em eleições como essa. Desde 1913, quando o voto direto foi implementado para o Senado, o partido que controla a Casa Branca perdeu cadeiras no Congresso em 75% das "midterm elections", como são chamadas as eleições que não coincidem com a presidencial.
Cook prevê um resultado que irá novamente mostrar a divisão da sociedade americana.
"Em 2000, as eleições presidenciais foram decididas por cerca de 500 votos na Flórida. Desta vez, também estão divididas, imprevisíveis. Não haverá um vencedor claro", analisa.
Segundo ele, embora os republicanos pretendam retomar a agenda doméstica se venceram as eleições, só lhes resta, durante a campanha, usar a bandeira da política externa, da guerra contra o terrorismo.
"Existe uma força enorme na sociedade empurrando as eleições em direção aos democratas. É a fatia dos que se preocupam com a economia. Mas há também preocupações de política externa, como o terrorismo e o Iraque, fazendo força em direção contrária. Fora isso, há os interesses locais, divididos igualmente entre os dois partidos."
Aparentemente, a divisão do eleitorado reflete-se na divisão do próprio Congresso americano e tem contribuído para a obstrução de projetos e de nomeações não-relacionadas com a guerra contra o terrorismo.
Nos quatro meses em que governou com o apoio das duas Casas, Bush conseguiu obter a aprovação de 80 dos 130 juízes que indicou para cortes superiores. Cinquenta nomeações estão paradas por oposição dos democratas.
Além disso, Bush não consegue aprovar sua versão da lei que garante assistência social do Estado. Parte do "conservadorismo com compaixão", o projeto do presidente canaliza recursos para entidades religiosas e exige dos pobres e desempregados que trabalhem ao menos 40 horas por semana para que tenham direito aos benefícios.
Um exemplo claro foi a dificuldade republicana de nomear o cubano-americano Otto Reich para o posto de subsecretário de Estado responsável para a América Latina. Reich tem desempenhado essa função por meio de um dispositivo legal de emergência que garante a permanência de pessoas em cargos sem nomeações aprovadas pelo Senado.


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