São Paulo, quarta-feira, 04 de fevereiro de 2009

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Libertado, ex-governador critica Uribe

Alan Jara, que passou quase oito anos como refém das Farc, diz que presidente nada fez por libertações e pede negociação

Ex-sequestrado encontra mulher e filho de 15 anos; deputado deve ser solto amanhã, na última fase de missão com apoio brasileiro

Mauricio Duenas/France Presse
Alan Jara (esq.) abraça o filho, Felipe, ao descer do helicóptero brasileiro, e estende os braços para o abraço da mulher, Claudia

DA REPORTAGEM LOCAL

Às 14h12 (17h12 no Brasil), o helicóptero Cougar do Exército brasileiro que transportava Alan Jara aterrissou na cidade colombiana de Villavicencio, pondo fim a quase oito anos de seu cativeiro na selva. O filho do ex-governador de Meta -único, de 15 anos- correu até ele e o abraçou antes mesmo que ele descesse da aeronave. Jara puxou a mulher para o abraço conjunto.
A imagem foi o desfecho da segunda etapa da missão humanitária coordenada pelo Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) e liderada pela senadora oposicionista Piedad Córdoba. Ela negociou a libertação unilateral de seis reféns pelas Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia), que, fracas e desmoralizadas, tentam algum oxigênio político. A missão tem o apoio logístico do Brasil.
Magro, com cabelo grisalho, Jara, 51, disse que estava bem, no geral, mas que sofria de um problema na tireoide e em um olho. Ele seria submetido a checagem médica ainda ontem.
Em suas primeiras declarações, o ex-refém criticou duramente as Farc e o governo do presidente Álvaro Uribe. Disse que ambos querem guerra na Colômbia. "Uribe não fez nada por nossa libertação."
O ex-governador fez uma defesa enfática de uma negociação política com a guerrilha e anunciou sua entrada para o grupo de Córdoba, os Colombianos pela Paz. Questionado, criticou a estratégia de cerco humanitário do governo -pressão militar ao redor de um perímetro onde há reféns. "Uma operação equivale a uma sentença de morte."
Descreveu as Farc como acossadas militarmente, mas não derrotadas. Disse que a guerrilha segue atraindo jovens. "As Farc não estão derrotas de jeito nenhum. Há muita gente lá, jovens. Não vejo outra saída que não a negociada."
O presidente Álvaro Uribe, desde a caribenha Santa Marta, felicitou Jara, mas devolveu as críticas ao grupo de Córdoba, que ontem disse ter conversado com um guerrilheiro "sério" sobre libertações: "A paz nasce de uma grande determinação de derrotar o terrorismo. [...] A paz não nasce de ficar cortejando os terroristas."

Comoção e bom humor
O ex-governador falou por quase duas horas com os jornalistas em Villavicencio, capital de Meta, a 115 km de Bogotá. "Estou disponível. Descansei sete anos e meio. Tenho todo o tempo do mundo." A rádio Caracol transmitiu pela internet.
Mesclava relatos dramáticos do cativeiro de "2.670 dias" -como o caminhar pela selva atado a correntes- com observações bem-humoradas sobre a fauna ou o cardápio monótono. Conhecido como "professor" da selva -dava aula de inglês e russo todos os dias-, o engenheiro civil formado em Kiev (Ucrânia) citou colegas sequestrados por nome. Contou que dois deles, punidos pela guerrilha, estão presos um ao outro por correntes há dois anos.
"Ouvi meu filho crescer por sete anos e meio", disse, citando os programas de rádio pelos quais ouvia o adolescente Alan Felipe, que tinha 7 anos quando o pai foi capturado em 2001. "Nos roubaram esse tempo."
A mulher de Jara, Claudia Rujeles, fez campanha por sua libertação durante todo o período. À Folha, no domingo, Felipe disse que um de seus primeiros planos era explicar ao pai os avanços tecnológicos. "Quero explicar para ele como funciona tudo agora."
O ex-governador do Partido Liberal, o mesmo de Córdoba, foi o quinto refém libertado pelas Farc. Amanhã, deve ser entregue o sexto e último, o ex-deputado Sigifredo López.
No domingo, foram libertados três policiais e um soldado, em uma ação perturbada por voos militares colombianos e pela quebra da confidencialidade por parte de um dos mediadores a bordo -ele falou com a cadeia chavista Telesur.
Ontem, a Colômbia agradeceu o Brasil, que também foi elogiado pelo Departamento de Estado americano pela atuação na missão. A rádio Caracol registrou que, ante a emoção da chegada de Jara, a tripulação brasileira do Cougar comemorou abrindo uma bandeira brasileira.

FLÁVIA MARREIRO, Com agências internacionais



Texto Anterior: Alemães: Merkel cobra bento 16 sobre holocausto
Próximo Texto: Frases
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.