São Paulo, quinta-feira, 04 de março de 2010

Próximo Texto | Índice

CATÁSTROFE NO CHILE

Chile admite erro em prevenção de tsunami

Marinha reconhece não ter alertado sobre risco de ondas gigantes, que acabaram causando mais mortes e destruição na costa

Bachelet aponta falhas de comunicação; resposta a tremor ameaça legado de presidente, que deixa o cargo na semana que vem


Martin Bernetti/France Presse
Moradores de Constitución, cidade com mais mortos em decorrência do terremoto de sábado no Chile, correm após rumores de que novo tsunami atingiria cidade

THIAGO GUIMARÃES
DA REPORTAGEM LOCAL

A Marinha do Chile reconheceu ter descartado, nas primeiras horas após o terremoto que atingiu o país no sábado, a existência de risco de tsunami -que acabou ocorrendo e gerou o maior número de mortos e estragos em zonas costeiras.
Em entrevista na noite de anteontem, o comandante da Marinha, Edmundo González, admitiu que a corporação foi imprecisa ao informar a autoridades do governo -inclusive à presidente Michelle Bachelet- sobre o perigo de ondas gigantes atingirem o litoral.
"Fomos pouco claros na informação que entregamos [à presidente]. Não fomos precisos em dizer a ela se se mantinha ou se cancelava [o alerta de tsunami]. E isso, sem dúvida, fez com que o Onemi [Escritório Nacional de Emergências] não emitisse o alerta", disse.
O reconhecimento do erro alimentou a crescente onda de críticas à atuação do governo na catástrofe, que até ontem somava 802 mortes. Além da falha no sistema de emergência militar, o coro de desaprovação aponta demora no controle da desordem nas áreas mais afetadas, cenário de saques.
As reações negativas à fala de González fizeram a Marinha divulgar nota na noite de ontem, sustentando que emitiu alerta de tsunami ao governo, cancelado depois. "É possível identificar falhas no cancelamento posterior do alerta, o que se investiga minuciosamente pelas repercussões que tudo isso teve na opinião pública", diz o texto.
"O Estado se revelou menos preparado do que se supunha. Há um sentimento crítico pelo que se consideram vacilos na ação do governo", disse à Folha o sociólogo Raúl Sohr, para quem o desastre trará danos à imagem de Bachelet, que entrega o cargo na próxima semana e hoje ostenta aprovação recorde, na casa dos 80%.
Diante das críticas, Bachelet reforçou suas aparições públicas e a presença militar em cidades com registro de saques -situação controlada ainda na terça-feira. Ontem, em entrevista, acusou o golpe ao afirmar que "aqui somos todos generais depois da guerra".
Emocionada, a presidente disse que não cabe agora "passar faturas políticas". Elogiou a "hombridade" do chefe da Marinha pela admissão do erro. "Liguei infinitas vezes perguntando se existia risco de tsunami. A verdade é que havia um problema de comunicação."

Novo governo
O desastre natural também alterou o cenário político para o governo de Sebastián Piñera, primeiro conservador eleito no país desde o fim da ditadura Pinochet (1973-1990). Fiador de promessas ousadas, como criar 200 mil empregos por ano, o empresário já disse que mudará seu plano de governo para privilegiar a reconstrução.
"O risco de não cumprir suas promessas pode limitar a lua de mel de Piñera com a população", diz o sociólogo Eugenio Tironi. Para o historiador Alfredo Jocelyn-Holt, um desastre em meio a uma transição presidencial enseja continuidade política, facilitando a defesa feita por Piñera de um governo de "unidade nacional", que acabou não se refletindo na formação de seu ministério.


Próximo Texto: Depoimento: Chilenos riem de repórter sobressaltado
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.