São Paulo, sexta-feira, 04 de março de 2011

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MINHA HISTÓRIA KAREN PATTERSON, 42

Um artista atrás das grades

O artista chinês Wu Yuren está preso há cerca de 9 meses depois de participar de uma marcha; sua mulher, Karen Patterson, luta pela sua libertação

RESUMO - Em fevereiro de 2010, Wu Yuren, 39, e outros 25 artistas fizeram o primeiro protesto em direção à praça da Paz Celestial desde o massacre de estudantes, em 1989.
A sua vida não foi mais a mesma. Após alguns incidentes, o artista foi preso em maio acusado de atacar policiais.
Do lado de fora, a sua mulher, a canadense Karen Patterson, 42, tem feito o que muitos familiares de outros presos chineses na mesma situação não podem ou temem: falar.

Depoimento a (...)
FABIANO MAISONNAVE
DE PEQUIM

Meu nome é Karen Patterson, sou de Calgary, Canadá. Vivo na China há 15 anos, trabalhando primeiro como professora de inglês, depois em galerias de arte. Agora, tenho um pequeno negócio.
Conheci meu marido dentro da comunidade artística, há quase dez anos. Nos casamos em 2003, e nossa filha nasceu em agosto de 2004. Ela tem 6 anos e não vê o pai há quase nove meses agora .
O trabalho do meu marido, Wu Yuren, é multimídia, conceitual. Ele faz pintura, fotografia, filme e um pouco de escultura. Eu não diria que é abertamente político. Há talvez uma peça ou duas, mas ele não é conhecido como um artista político. Muitos concordavam que o que Liu Xiaobo [dissidente condenado a 11 anos de prisão e ganhador do Nobel da Paz de 2010] escreveu na Carta 08 era para todos, e não apenas para a comunidade artística. Portanto, como um cidadão pensante, que quer mudança, ele assinou o documento.
No ano passado, ele foi despejado do seu estúdio, onde ele havia investido tempo e dinheiro. Os artistas haviam assinado um contrato de 20 anos com a empresa local, que tinha o apoio do governo. Mas eles apareceram com a nota de despejo 18 meses depois da assinatura.

MARCHA
Os artistas então se reuniram para buscar uma compensação. Eles tentaram várias formas de chamar a atenção das autoridades, mas ninguém os ouvia. Isso se arrastou por oito meses. Ao mesmo tempo, eram pressionados pelas autoridades locais: interrompiam a energia e o aquecimento.
Em 22 de fevereiro, às 2h da madrugada, de 60 a 80 capangas contratados despejaram alguns que ainda moravam lá. Com barras de ferro, eles quebraram carros e golpearam algumas pessoas. Seis ou sete foram parar no hospital. Yuren foi um deles.
Eles acharam que havia sido a gota d'água e decidiram fazer algo que chamasse a atenção. Pensaram numa rápida marcha na avenida Chang'an [a principal da cidade]. Eram entre 20 e 30 pessoas, com faixas. Andaram por 15 minutos no sentido da praça da Paz Celestial.
Todos sabemos o que houve lá em 1989. Mas o que eles não sabiam é que ninguém havia feito uma marcha em direção à praça desde então.

PORTA FALSA
Os policiais chegaram, tomaram as faixas e mandaram todos pra casa. Duas semanas depois, chamaram um dos artistas e disseram: "Ei, vamos dar a vocês check-ups médicos para estar seguros de que vocês estão bem".
Quatro deles, incluindo Yuren, foram ao hospital. Ali, entraram numa porta falsa que dava diretamente a uma van. Foram detidos numa delegacia por pelo menos 24 horas. Yuren foi solto 30 horas mais tarde.
Ele foi detido novamente ao acompanhar um amigo a uma delegacia para fazer uma ocorrência. Foi acusado de interferir no trabalho da polícia de forma violenta.
Nas primeiras cinco horas, foi espancado por cinco policiais. Colocaram a camisa sobre a sua cabeça e as mãos nas costas. Depois, ele pediu que fizessem um raio-X porque achou que tinha lesões. Fizeram o exame, que ele nunca pôde ver. E quando o advogado pediu as chapas, haviam desaparecido.
Ele tem os movimentos limitados no ombro por causa do espancamento. Nunca recebeu tratamento médico. Ele está numa cela com outras pessoas, mas não tenho muitos detalhes porque não posso falar com ele.
O julgamento foi dividido em dois dias. A prova dada pela polícia foi baseada num vídeo editado. Pedimos a íntegra, mas a polícia disse que, por causa de reformas, todo o material havia sido apagado. Tome suas próprias conclusões, mas basicamente ele está lá sem nenhuma prova. Agora, estamos esperando a sentença.
Pela lei chinesa, a família não pode visitar o preso até que ele seja sentenciado. O meu maior desejo é que a filha possa ver o pai.


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