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São Paulo, domingo, 04 de maio de 2003

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EPIDEMIA

De posse do genoma do vírus, pesquisadores correm para descobrir a imunização, enquanto antivirais falham

Cientista prevê vacina anti-Sars em 18 meses

CLAUDIO ANGELO
EDITOR-ASSISTENTE DE CIÊNCIA

Ele é um vírus inteiramente novo, de origem desconhecida, que mata de 3% a 10% de suas vítimas e se propaga com uma rapidez assustadora. Essa é a parte ruim da história. A boa é que o causador da pneumonia asiática pode ser contido com eficiência. E a busca de uma vacina já começou.
Segundo a infectologista canadense Caroline Astell, que ajudou a sequenciar o genoma do coronavírus que provoca a Sars (síndrome respiratória aguda grave) e que trabalha no desenvolvimento de uma imunização contra o parasita, a primeira vacina deve estar disponível em "no mínimo 18 meses". "Uma vez que existem vacinas eficientes contra coronavírus de animais, temos todas as razões para crer que uma vacina contra a Sars pode ser desenvolvida", disse Astell à Folha.
Segundo a pesquisadora canadense, a imunização é a única forma de combater o vírus na China continental, país de origem da epidemia e no qual o número de casos ultrapassa 3.800.
Outro motivo pelo qual os pesquisadores apostam numa vacina é o fato de que a eficiência de drogas antivirais costuma ser baixa -e a mais promissora delas tem mostrado resultados divergentes.
Como só estão vivos quando infectam uma célula, os vírus só podem ser combatidos de dois jeitos: pelo próprio sistema imunológico da vítima ou por medicamentos que bloqueiem uma etapa da sua replicação (antibióticos não funcionam contra eles). A vacina treina a defesa do corpo a reconhecer o invasor e atacá-lo.
Quando a Sars começou a fazer vítimas em Hong Kong e no Canadá, alguns pacientes foram tratados com sucesso com ribavirina, uma droga que sabota a replicação do vírus inibindo uma de suas proteínas, a polimerase.
"O problema é que a ribavirina não teve efeito nenhum sobre o vírus in vitro [no laboratório"", afirmou o infectologista Marco Marra, que coordenou o genoma do vírus no Canadá.
Nos EUA, os CDC (Centros para Controle e Prevenção de Doenças) e o Niaid (Instituto Nacional de Alergia e Doenças Infecciosas) já estão iniciando contatos com as empresas GlaxoSmithKline e GenVec produzir uma vacina. Segundo a revista "The Scientist", o Niaid já está usando dados da sequência genética do vírus para criar uma imunização.
Enquanto isso, o mundo tenta conter o vírus como pode. A biotecnologia e a estruturação da Organização Mundial da Saúde já evitaram um desastre maior.
"No começo dos anos 80, levou dois anos para identificar o HIV como causador da Aids", afirma o editorial de ontem da revista médica "The Lancet". "A OMS criou uma rede de laboratórios que identificou o vírus associado com a Sars em duas semanas."
As medidas de contenção tradicionais também parecem estar dando resultado. Um estudo de Hong Kong, publicado também ontem na "The Lancet", mostra que quatro medidas simples -lavar as mãos, usar luvas, máscara e avental- evitou que 69 de 241 funcionários de hospitais estudados contraíssem a doença. Todos os infectados omitiram pelo menos um desses cuidados.
Um modelo matemático desenvolvido com base em dados de Hong Kong e do Canadá pelos brasileiros Eduardo Massad e Marcelo Burattini, da Faculdade de Medicina da USP, mostra que o impacto dessas medidas pode ser ainda maior.
"Sem medidas de controle, Hong Kong teria 320 mil casos em 150 dias de epidemia, e o Canadá, 36.900 casos. Com o controle, a projeção cai para 1.820 em Hong Kong e para 150 no Canadá", disse Burattini à Folha.
Segundo ele, isso sugere que a forma de transmissão da Sars é a mesma do resfriado comum. "Mandamos o estudo para publicação na semana passada e dissemos que o controle da epidemia estava próximo na duas regiões."


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