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INTOLERÂNCIA
Discriminação liga imigrantes islâmicos ao terror; especialistas alertam contra racismo
Europa enfrenta "surto" de islamofobia
JOÃO BATISTA NATALI
DA REPORTAGEM LOCAL
A palavra islamofobia é recente.
Apareceu no Reino Unido há coisa de 13 anos. Mas ganhou na Europa um significado mais preciso
depois do 11 de Setembro e foi reforçada em março último com os
atentados em Madri.
O terrorismo islâmico teve entre
seus efeitos dar visibilidade à minoria muçulmana nos países europeus, disse à Folha a egípcia
Fawzia Al Ashmawi, professora
da Universidade de Genebra e integrante da Associação Suíça de
Cultura Islâmica.
A minoria muçulmana antes se
diluía nas sociedades européias
que as abrigam. De uma hora para outra, o medo do terrorismo
atribuiu a elas um diferencial negativo. "Ocorreram agressões a
mulheres que cobrem a cabeça
com o véu e atentados contra
mesquitas", afirma.
Não é fácil medir a extensão do
sentimento islamofóbico. A
União Européia possui em Viena
um Centro de Monitoramento
sobre Racismo. Em 2002, ele lançou um alerta em razão do crescimento de incidentes em países até
então tidos como tolerantes, como a Dinamarca e a Suécia.
Em fevereiro passado, o centro
promoveu uma mesa redonda em
Bruxelas, na qual basicamente
constatou a gravidade do problema e recomendou políticas -nas
áreas da educação e do emprego,
por exemplo- capazes de contorná-lo.
"O racismo contra as minorias
muçulmanas na Europa é antigo", disse à Folha Valérie Amiraux, cientista política francesa e
pesquisadora no CNRS (Centro
Nacional de Pesquisa Científica).
O que há de novo, segundo ela, é
"um ódio pelo islã enquanto religião". Na França, nos segmentos
minoritários que o professam, esse sentimento está se tornando
uma forma de ódio bastante simétrica à judeofobia, forma
agressiva de anti-semitismo.
Mesmo assim, segundo Amiraux, o 11 de Setembro não provocou em seu país nenhuma onda
de agressões físicas ou depredações de mesquitas.
As pesquisas indicam que os
franceses têm hoje uma compreensão bem mais exata dos hábitos e da religião da segunda ou
terceira geração de muçulmanos
imigrados. Mas persiste a discriminação étnica. Um dos mais notórios indícios, argumenta a pesquisadora, foi a Lei do Véu, que
proíbe as adolescentes islâmicas
de cobrirem a cabeça nas escolas.
Tal lei seria "impensável no Reino Unido", disse à Folha Tim Niblock, diretor do Instituto de Estudos Islâmicos e Árabes da Universidade de Exeter.
Tradicionalmente, os britânicos
enxergam a si próprios como
uma soma de diversidades culturais -ingleses, galeses-, cuja recente experiência com o terrorismo está ligada ao IRA, o Exército
Republicano Irlandês.
Mesmo assim, Niblock diz que,
de dois anos para cá, alguns britânicos demonstram menor tolerância com os muçulmanos.
O 11 de Setembro teve no Reino
Unido dois efeitos contrários. Pelo primeiro, segmentos cada vez
maiores da população passaram a
identificar o islamismo com o terrorismo. Mas, paralelamente,
quando o premiê Tony Blair se
preparava para invadir o Iraque
ao lado dos EUA, as manifestações contrárias à guerra foram
fortes porque cidadãos britânicos
e imigrantes muçulmanos fundiram-se sob uma idéia que também rejeitava a discriminação.
A possibilidade de a Turquia ingressar na União Européia trará
um componente islâmico muito
mais forte. "Há um longo processo de educação das pessoas para a
nova realidade", diz Niblock.
Não se conhece o impacto da islamofobia no mercado de trabalho. Fawzia Al Ashmawi, a professora de Genebra, diz ter informações de que a o desemprego entre
imigrantes muçulmanos na Europa é hoje maior que a dos trabalhadores brancos e negros.
"Ao se candidatar a um emprego, alguém que se chame Mohammed tem sua candidatura de
imediato descartada", diz ela.
Ashmawi é autora de um estudo
de 1999 sobre a imagem que os livros didáticos europeus davam
do islamismo. Ela está refazendo a
pesquisa e diz que essa imagem se
degradou. "Há mapas do Oriente
Médio apresentados como região
de terroristas e inimigos da democracia", diz ela.
Se nos Estados Unidos criticar o
islamismo é se posicionar ao lado
dos conservadores "patriotas", na
Europa tal posicionamento levaria seu autor a um alinhamento
bem mais comprometedor -ao
lado da extrema direita.
Há poucas exceções, como a do
historiador Alain Bensançon, para quem o islamismo inspiraria
uma justificada reserva em razão
da diluição da identidade européia em meio à aceitação indistinta da diversidade cultural.
E há também os casos mais caricaturais, como o da jornalista italiana Oriana Fallaci. Ela está lançando seu segundo panfleto antiislâmico após o 11 de novembro.
Chama-se "A Força da Razão".
Ela retoma o argumento segundo o qual os europeus têm razão
em temer os árabes, porque hoje
vivem numa "Eurábia", invadida
por imigrantes com taxas de fertilidade superiores às dos cristãos, e
por hospedarem os que supostamente só conhecem a linguagem
do ódio. Seu primeiro panfleto,
"O Ódio e o Orgulho", vendeu 160
mil exemplares.
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