São Paulo, sexta-feira, 04 de junho de 2004

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CIA ainda se recupera de cortes nos anos 90

Um ano antes da guerra, a CIA tinha apenas quatro fontes de inteligência dentro do governo iraquiano

DOUGLAS JEHL
DO "NEW YORK TIMES"

Mesmo agora, mais de 30 meses após os ataques do 11 de Setembro, o serviço de inteligência secreto dos EUA tem menos de 1.100 operadores no exterior, um número menor do que o de agentes do FBI (a polícia federal americana) alocados para o escritório da cidade de Nova York.
Desde que George Tenet assumiu a direção da CIA (Agência Central de Inteligência) há sete anos, a reconstrução do órgão foi a sua prioridade. Somente em 2004, mais operadores se formarão no curso de Camp Peary (Virgínia) do que em qualquer outro ano desde a década de 60. Eles são o resultado de agressivos esforços de recrutamento para atrair falantes de línguas árabes e outros capazes de operar no Oriente Médio e no Sudeste Asiático.
No entanto, Tenet e outros advertem que será preciso mais cinco anos para que a reconstrução esteja completa e os EUA tenham montada a rede que precisam para adequadamente responder à ameaça global representada por grupos terroristas e governos estrangeiros hostis. James Pavitt, que, como vice-diretor de operações, supervisiona o serviço secreto, diz que precisa de um quadro 30% ou 35% maior.
O tamanho e o escopo do serviço secreto -cujos operadores no exterior recrutam e supervisionam os espiões e trabalham com os serviços de inteligência de outros países para obter informações, mas raramente se infiltram pessoalmente em alvos estrangeiros- sempre estiveram entre os segredos mais bem guardados do governo.
À medida que a dimensão dos fracassos da inteligência no Iraque e no 11 de Setembro começou a vir à luz nos últimos meses, o mesmo aconteceu em relação à situação das operações americanas de espionagem que foram negligenciadas nos anos 90 e que só agora estão se recuperando.
Segundo Pavitt, o serviço secreto atingiu seu ponto mais baixo em 1999, quando seus quadros foram cortados 20% em relação ao auge da Guerra Fria. "Não tenho como dar uma idéia da quantidade de informação que deixamos de colher, das operações que não fizemos, do número de boas fontes que não recrutamos", afirma Porter Goss, deputado republicano e ex-operador da CIA que preside a comissão de inteligência da Câmara de Deputados.
Do fracasso em antecipar o teste nuclear da Índia de 1998 aos relatórios equivocados sobre o arsenal de armas proibidas do Iraque, a debilidade das operações de inteligência da CIA se manifestou em repetidos constrangimentos. Em momentos críticos, funcionários da inteligência reconheceram em depoimentos e entrevistas recentes, a CIA se mostrou incapaz de recrutar agentes que pudessem dar informações confiáveis sobre Saddam Hussein e a rede terrorista Al Qaeda. A agência teve que confiar largamente em informação de serviços de inteligência estrangeiros, cujos dados se mostraram freqüentemente dignos de pouco crédito.
Funcionários da inteligência agora admitem que, um ano antes da invasão do Iraque -um alvo prioritário havia mais de uma década-, a CIA tinha apenas quatro fontes de inteligência dentro do governo iraquiano.
Além dos cortes de orçamentos, funcionários da inteligência e parlamentares democratas e republicanos citam como uma das fontes dos problemas uma cultura de aversão ao risco. Esse comportamento foi intensificado por uma normativa -baixada em 1995 pelo predecessor de Tenet, John Deutch, na esteira de um escândalo sobre atividades da CIA na Guatemala- que foi largamente interpretada por funcionários do serviço secreto como um alerta contra a associação com pessoas repreensíveis.
Eles também apontam a falta de agilidade de uma organização altamente burocratizada, cujos operadores secretos são geralmente homens brancos destacados para embaixadas. Na grande maioria dos casos, esses operadores se apresentam como diplomatas ou outro tipo de funcionário governamental -uma fachada que alguns críticos vêem como muito transparente para permitir ações em terrenos distantes dos círculos diplomáticos.
"Em condições ideais, dentro de dez anos, 50% dos operadores deveriam estar sob uma cobertura não-oficial", diz Reuel Marc Gerecht, um ex-operador da CIA que cita entre os novos disfarces profissões como banqueiros e consultores.
Como o orçamento geral da CIA é informação "classificada", suas autoridades não revelam o quanto a agência e o serviço secreto cresceram nos últimos anos, particularmente no período desde o 11 de Setembro, em que se acredita ter havido um extraordinário aumento em gastos e contratações. O orçamento global da comunidade de inteligência, que compreende 15 agências, está chegando a US$ 40 bilhões anuais.
Pavitt afirma que hoje 50% das verbas da diretoria de operações (uma das três maiores seções da CIA; as outras são a de ciência e tecnologia e a de inteligência) e 30% dos funcionários do serviço secreto estão envolvidos diretamente com o terrorismo -uma enorme mudança em relação a 15 anos atrás, quando o foco estava na ameaça soviética.
Pavitt diz que a CIA está somente agora deixando para trás o que classifica como uma percepção errada dos operadores de que eles estavam proibidos de fazer negócios com criminosos e outras pessoas repreensíveis.
"Eu não vou vencer o terrorismo a menos que eu recrute o terrorismo. Eu não vou vencer nas questões duras dessa área a menos que eu esteja bem no meio delas", afirma Pavitt. "Eu me preocupo intensamente com o fato de que há pessoas que estão tentando nos matar neste exato momento em que conversamos. É uma ameaça extraordinária."


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