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SENSACIONALISMO
Para colunista do 'The Times', só 'culpa nacional' provocada por acidente mudaria jornais
Repressão sexual explica obsessão de
britânicos por famosos, diz jornalista
OTÁVIO DIAS
da Reportagem Local
O jornalista inglês Mathew Par
ris, colunista político do jornal
"The Times", acha que a popula
ção britânica é sexualmente repri
mida e, por isso, tem tanto apetite
por notícias escandalosas sobre as
vidas privadas de pessoas famosas.
"O britânico, em geral, sente-se
embaraçado diante de sua própria
sexualidade", disse Parris, em en
trevista por telefone à Folha. "Ele
extravasa isso com um apetite vo
raz por detalhes escandalosos e pi
cantes da vida dos outros."
Homossexual assumido, Ma
thew Parris, 47, fala com conheci
mento de causa. Em 1995, ele lan
çou o livro "Grandes Escândalos
Parlamentares -Quatro Séculos de
Calúnias, Injúrias e Difamações".
No livro, o jornalista faz um apa
nhado dos escândalos envolvendo
personagens da política britânica
nos últimos 400 anos.
"No Reino Unido, um escânda
lo só faz sucesso se tiver sexo. Es
cândalos financeiros dificilmente
atraem o interesse", diz o autor,
que agora planeja um livro sobre
escândalos dentro da Igreja.
Parris comparou o interesse dos
britânicos pela vida alheia à paixão
dos brasileiros pelas telenovelas.
"No Brasil, vocês têm as nove
las. Aqui, a novela é a vida real das
pessoas", diz. "Especialmente se
as pessoas forem reais de fato, ou
seja, membros da família real."
'Culpa nacional'
O colunista não acredita nos
efeitos práticos de uma legislação
que estabeleça limites à atuação
dos meios de comunicação.
"Só haverá mudança se as pes
soas, motivadas por uma espécie
de 'culpa nacional' em função da
morte de Diana, começarem a exi
gir uma atitude diferente dos jor
nais", disse.
Para ele, no entanto, isso dificil
mente acontecerá porque há uma
demanda por notícias sensaciona
listas por parte de uma fatia consi
derável dos leitores britânicos.
"Ao contrário de outros países,
como a França, no Reino Unido
todo mundo lê jornal, dos mais ri
cos aos mais pobres, dos mais ins
truídos aos menos escolariza
dos", afirma Parris. "É natural
que haja espaço para uma impren
sa mais vulgar."
O Reino Unido da Grã-Bretanha
e Irlanda do Norte tem 58,4 mi
lhões de habitantes, e a soma das
tiragens diárias dos 11 principais
jornais chega a 13,6 milhões de có
pias (uma para quatro pessoas).
'Show populista'
Parris acredita que a morte de
Diana levará o primeiro-ministro
do Reino Unido, Tony Blair, a pro
por uma lei que imponha limites
ao jornalismo sensacionalista pra
ticado por parte dos meios de co
municação britânicos, especial
mente pelos tablóides.
"O governo trabalhista de Tony
Blair é muito populista e deve res
ponder ao clamor momentâneo da
população por um controle
maior", diz o jornalista.
Mas, segundo ele, a iniciativa se
rá apenas um "show" e não con
seguirá conter os excessos.
Antes de exercer sua função
atual de principal jornalista do
"The Times" no Parlamento bri
tânico, Parris já foi deputado.
Ele foi eleito pelo Partido Con
servador em 79, depois de ficar fa
moso por ter mergulhado no rio
Tâmisa, em pleno inverno, para
salvar um cachorro que se afogava.
Sua candidatura foi patrocinada
pela própria Margaret Thatcher,
então primeira-ministra, que po
sou para fotos ao lado de Parris, do
cachorro e do dono do cachorro.
Sete anos depois, Mathew Parris
se cansou da política e renunciou
ao mandato parlamentar.
Matilha
Embora faça parte do grupo de
jornalistas que trabalha nos cha
mados "jornais de qualidade"
-dirigidos a um público mais re
finado e, em princípio, menos in
teressado em escândalos- Parris
não engrossa o coro dos que que
rem fazer dos tablóides bodes ex
piatórios da tragédia de Diana.
"Nossos jornais são como cães
de uma matilha", afirma o colu
nista. "Os jornais ditos de prestí
gio só esperam os tablóides darem
a primeira mordida para também
avançar sobre a carniça", comple
ta Parris.
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