São Paulo, quinta-feira, 04 de outubro de 2001

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Cordel critica EUA e teme guerra

MARCELO BERABA
DIRETOR DA SUCURSAL DO RIO

Os ataques do dia 11 de setembro às torres do World Trade Center e ao Pentágono já estão registrados em cordel e são sucesso na maior feira do interior de Pernambuco, a de Caruaru, a 153 km do Recife e a mais de 5.000 km de Nova York.
"O Atentado Terrorista e o Nosso Sofrimento" tem versos de um dos mais tradicionais cordelistas do Nordeste, Olegário Fernandes, e ilustração em xilogravura de Dila.
O cordel reflete o sentimento dúbio que tomou conta da maior parte dos brasileiros e que já foi captado nas pesquisas de opinião: ao mesmo tempo em que condena o atentado -"tragédia traiçoeira" praticada por "gênios desumanos"-, o poeta dá um puxão de orelha nos Estados Unidos. "Porém, o americano/ forte, rico e potentado,/ e a metade do mundo/ por ele é dominado,/ está colhendo no presente/ o que plantou no passado."
O texto aproxima o nordestino do drama que tomou conta dos Estados Unidos e que mantém o resto do planeta em suspense. "Há muitos anos que a gente/ sofre no alto grau/ seca, fome e carestia/ no povo metendo pau/ e agora pra completar/ vem a guerra mundial."
Olegário Fernandes tem 69 anos e é autor de 206 cordéis. O primeiro, "História do Boi de Mina e as Carnes Contaminadas", é de 1956. Seu maior sucesso foi "O Menino de Duas Cabeças", de 1968, que já vendeu mais de 100 mil exemplares. Ele é o fundador do Museu do Cordel, em Caruaru.
"O Atentado" foi escrito na última terça-feira à noite, mandado para a gráfica na quarta e na quinta-feira estava sendo vendido na feira e enviado para São Paulo. O cordel foi escrito em sextilhas, a partir das imagens a que Olegário assistiu na TV.
A xilogravura que ilustra a capa do cordel, de Dila (José Soares da Silva), capta num mesmo instante os aviões se aproximando da torre, elas já em chamas e as pessoas desesperadas se lançando dos prédios.
Com as licenças poéticas e os erros ortográficos próprios do cordel, Olegário descreve com detalhes a tragédia, como se fosse um repórter que tivesse presenciado os ataques: "No dia 11 de setembro/ um dia de terça-feira/ do ano dois mil e um/ a tragédia traiçoeira/ atacou os Estados Unidos./ Foi a maior bagaceira."
Um dos choques é assim descrito: "Chegando lá na cidade/ fez um certo volteio/ e foi direto pra torre/ acertou mesmo no meio/ até hoje ninguém viu/ um acidente tão feio".
O espírito crítico em relação aos Estados Unidos não é novidade. Em outros versos, que não estão no cordel do atentado, Olegário Fernandes já tinha se referido ao domínio norte-americano: "Quinhentos milhões de dólares/ era essa a nossa reserva/ O americano veio/ e nela passou a régua/ É o Brasil se acabando/ e ele lavando a égua".



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