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ANÁLISE
Perspectivas são pouco animadoras
MÁRCIO SENNE DE MORAES
DA REDAÇÃO
Duas questões ameaçam o futuro do processo de estabilização do
Afeganistão. É viável criar um Estado democrático num país sem
tradição de pluralismo político à
ocidental? As condições de segurança do Afeganistão pós-Taleban permitirão que as instituições
democráticas criem raízes?
O fator cultural é o mais espinhoso. Desde 1919, quando o Tratado de Rawalpindi deu ao Afeganistão controle total sobre suas
relações exteriores, libertando-o
formalmente da influência britânica, os afegãos jamais conheceram um sistema democrático.
Tiveram um regime monárquico, um militar e um marxista.
Após a queda do último, em 1979,
a URSS invadiu o país, dando início a um ciclo de sangrentos conflitos, terminado no final de 2001.
Nem o Acordo de Bonn, que rege a reconstrução do Afeganistão,
assegura a defesa da democracia.
Ele afirma que os afegãos têm "o
direito de determinar seu futuro
político de acordo com os princípios do islã, da democracia, do
pluralismo e da justiça social". A
ordem dos fatores não é casual.
Como esperado, o projeto de
Constituição diz que o islã será a
pedra angular da sociedade (todavia não ficou estabelecida a volta
da sharia -a lei islâmica). Até
que ponto isso permitirá a consolidação das instituições democráticas é uma questão sem resposta.
A insegurança que impede o
fortalecimento do poder central é
outro ponto crítico. Nos últimos
meses, mais de 300 pessoas morreram perto de Candahar, antigo
reduto do Taleban. Ex-membros
do movimento extremista ainda
são bastante ativos na região.
Chefes de guerra, que controlam áreas enormes e, às vezes,
mais ricas que a do governo (Cabul), desafiam o poder central. Ismail Khan, governador de Herat,
é considerado o homem mais rico
do Afeganistão, já que domina o
comércio com o Irã, e não se deu
nem ao trabalho de receber a delegação da ONU que está no país.
No norte, o uzbeque Abdul Rashid Dostum e o tadjique Ustad Atta Mohammad enfrentam-se pelo
controle do comércio local -lícito ou não. E, segundo um estudo
da ONU divulgado na semana
passada, o tráfico de ópio voltou a
ter papel crucial na economia do
Afeganistão, podendo torná-lo
um "país de narcoterroristas".
Assim, em outubro, o Conselho
de Segurança aprovou a expansão
da força militar internacional que
protege Cabul para outras áreas.
Uma equipe alemã já prepara o
envio de 450 homens a Cunduz
(norte). Porém nenhum país ofereceu tropas para outras regiões,
consideradas inseguras demais.
A chance da aceitação geral de
uma Constituição baseada em
princípios mais ou menos democráticos resta, portanto, mínima.
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