São Paulo, quinta-feira, 05 de maio de 2005

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DRAMA

Entre os imigrantes detidos, que dormem amontoados, há até um bebê de 1 ano e 3 meses

Presa brasileira relata horror no México

Fabiano Maisonnave/Folha Imagem
Elenita Freitas na prisão para imigrantes na Cidade do México


DO ENVIADO ESPECIAL

Quando começou uma briga entre os presos da ala masculina da Estação Migratória de Iztapalapa, na Cidade do México, na manhã de segunda-feira, a goiana Elenita Alves Freitas, 42, explicou assim os gritos e os sons de cassetetes à sua neta Sara, de seis anos: "Eles estão jogando futebol".
A estratégia, que lembra o filme "A Vida é Bela", falhou no dia seguinte, quando presas chinesas e policiais mexicanas trocaram socos e empurrões por causa do uso do telefone. Segundo a avó, Sara viu a cena. Ficou assustada, mas não chorou.
A reportagem da Folha estava na entrada da estação quando começou o tumulto, por volta das 9h. Durante cerca de 30 minutos, era possível ouvir gritos e barulhos de objetos se quebrando. A confusão acabou após a intervenção de 20 homens da tropa de choque, armados com escudos e cassetetes e reforçados por outros 15 guardas da estação.
Após alguns minutos de silêncio, um grupo de policiais sorridentes sai sorridentes do portão principal. Um deles gesticula com o cassetete, aparentemente mostrando como bateu num preso. Apenas um funcionário disse o motivo do tumulto: superlotação. O tumulto teria sido entre os presos chineses e centro-americanos.
Segundo uma ONG de direitos humanos mexicana, o local tem capacidade para abrigar cerca de 400 imigrantes, mas a estimativa é que haja cerca de 600 neste momento. A diretoria da estação se recusou a comentar.
Em entrevista à Folha anteontem à noite, numa sala da estação migratória, a costureira goiana contou, com voz fraca e pausada, que foi presa no dia 17 de abril na cidade fronteiriça de Nuevo Laredo, no lado mexicano.
Pouco antes, havia sido roubada e abandonada pelo coiote numa estrada. Perdeu malas, passaporte e US$ 1.500, conseguidos com a venda de seu carro, uma Belina 89, e um lote na sua cidade natal, Goiânia. "Ele me disse: "Cale a boca, senão morre; senão eu atiro e jogo dentro do rio"."
A goiana foi o único imigrante ao qual a Folha teve acesso, conseguido apenas após envio de dois faxes da Embaixada do Brasil no México e a intermediação da assessoria de imprensa do presidente Vicente Fox.
Segundo ela, as brasileiras dormem em um quarto com três beliches para 25 pessoas. A maioria dorme amontoada no chão, inclusive sua neta de seis anos e o bebê brasileiro, de um ano e três meses.
Além da superlotação, há também o problema da falta de água e da qualidade da comida -a goiana disse já ter encontrado cabelo e mosquito.
"Chega uma hora que não dá para entrar no banheiro. Falta água para dar descarga. Imagine você usando 200, 300 pessoas usando dois sanitários sem água", disse, com olhos marejados.
O serviço consulado brasileiro afirma que o caso das crianças é prioritário para deportação, mas que a volta ao Brasil depende de vários fatores, como disponibilidade nos vôos e a preparação dos documentos.
Há cerca de 120 brasileiros nesse local. No ano passado, cerca de 1.100 brasileiros passaram pela mesma estação entre janeiro e novembro. (FABIANO MAISONNAVE)

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