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Mandato pode não durar, diz trabalhista
ÉRICA FRAGA
DE LONDRES
Tony Benn, 80, atuou como parlamentar pelo Partido Trabalhista
por 50 anos até se aposentar, em
2001. Nas últimas semanas, fez
campanha pelo partido em 17 cidades do Reino Unido. Mas,
quando o assunto é Tony Blair, o
premiê trabalhista que concorre a
um terceiro mandato, Benn diz
acreditar que os dias do líder no
poder estão chegando ao fim.
Ele chegou a ir a Bagdá, em fevereiro de 2003, onde fez uma entrevista com o ex-ditador Saddam
Hussein que foi transmitida pela
TV britânica. Era uma tentativa
de evitar a guerra. Ele acabou se
tornando presidente da organização "Stop the war coalition", mas
não conseguiu impedir seu país
de atacar o Iraque. Agora, diz que
a decisão custará caro a Blair que,
para ele, o premiê já está "permanentemente prejudicado".
Leia a seguir, trechos da entrevista de Benn à Folha.
Folha - O Partido Trabalhista parece caminhar para um terceira vitória amanhã. Mas a popularidade
de Tony Blair está em queda. Como
o senhor analisa isso?
Tony Benn - Acho que as conquistas desse governo foram boas.
Eles colocaram muito dinheiro
em escolas, hospitais, ajudaram
os desempregados, mantiveram a
taxa de juros baixa, a inflação está
baixa. Mais empregos foram criados. Introduziram o salário mínimo. Portanto, fizeram coisas positivas. Mas a guerra no Iraque foi
muito impopular.
A razão pela qual fomos para a
guerra é muito simples: Bush
(George W. Bush, presidente dos
EUA) queria o petróleo e queria
bases americanas no Iraque e disse a Blair que era o que queria.
Blair fingiu que a guerra tinha a
ver com armas de destruição em
massa, mas não era isso. O primeiro-ministro, portanto, tem estado seriamente desacreditado. Se
ele tivesse dito para as pessoas "o
Bush quer que me una a ele e sinto
que é do interesse nacional britânico ir para a guerra", poderia ter
encontrado dificuldade em conseguir uma maioria no Parlamento, mas teria dado uma resposta
verdadeira. Mas ele nunca nos falou a verdade. Isso danificou a
imagem dele muito e, mesmo que
ganhe as eleições, acho que o preço que pagará em termos de credibilidade vai ser muito sério. Ele
pode até mesmo não sobreviver.
Folha - Como não sobreviver?
Benn - Não há uma maquinaria
constitucional específica para se
livrar de um primeiro-ministro,
mas, se ele ganhar e tentar fazer
coisas que as pessoas não aceitem,
por exemplo, se o Bush atacar o
Irã e o Blair apoiá-lo, haverá uma
explosão de raiva. E essa é uma
forma pela qual ele pode sair.
Ou pode ocorrer também que
ele esteja tão impopular que não
queira continuar. Você não pode
ser um líder se as pessoas não
acreditam em você.
Folha - Qual é sua opinião a respeito da transformação do partido
Trabalhista nos últimos anos?
Benn - Quando Blair se tornou
líder do Partido Trabalhista, 11
anos atrás, em 1994, ele disse que
o "Novo Trabalhismo" era um
novo partido político. Ele criou
um novo partido dentro do Partido Trabalhista que foi muito influenciado pelas políticas econômicas da senhora Thatcher (Margaret Thatcher, primeira-ministra
conservadora entre 1979 e 1990).
Quando ele ganhou em 1997, as
pessoas queriam uma mudança
de governo, mas a cidade de Londres não queria uma mudança de
políticas, portanto, apoiaram o
Blair. E o "Novo Trabalhismo" é
um partido conservador. Privatiza, não dá plenos direitos aos sindicatos, segue a política norte-americana etc.
Folha - O sr. diria que hoje o Partido Trabalhista é social-democrata?
Benn - O "Novo Trabalhismo" é
um partido conservador de centro. Mas o Partido Trabalhista, em
si, não mudou muito. Ainda acredita em justiça social, maior igualdade, fim do imperialismo. Acredita em todas as idéias progressistas que estiveram lá no início.
Acho que a única razão pela qual
o senhor Blair tem sido capaz de
manter o partido coeso, sob o
controle dele, é o fato de que ele
ganha eleições. Mas acho que esse
período está caminhando para o
fim. Acho que Blair está muito seriamente afetado, permanentemente, prejudicado, pela guerra.
Folha - Mas por que deverá ser
reeleito, então?
Benn - Acho que as pessoas não
querem os conservadores. Acho
que o Partido Trabalhista, pelo
que defende, tem um apelo. Acho
que o "Novo Trabalhismo", que
reúne Blair e alguns amigos, não é
muito popular e que tudo isso vai
ficar claro nas eleições.
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